Corrupção não é do PT, do PSDB ou do PMDB
O mais novo ministro do Supremo Tribunal Federal, Roberto Barroso, deu indicações, na quarta-feira (14/8), de que será uma voz a divergir do entendimento de que o caso do mensalão é um episódio isolado e singular de corrupção na história do país. Não dá para antecipar se Barroso irá, de fato, destoar da conclusão da maioria dos colegas que foi favorável à imposição de penas mais duras aos réus da Ação Penal 470, o processo do mensalão.
Porém, na volta do julgamento nesta quarta — quando os ministros passam a analisar os recursos interpostos no processo, que completa um ano do seu início formal na corte — Barroso criticou abertamente a percepção de que se trata de um caso de corrupção sem paralelos, o que justificaria condenações mais severas pela extensão e gravidade “ímpares” dos crimes julgados pelo STF.
Antes de começar a votar, nesta quarta, no julgamento dos Embargos de Declaração interpostos contra a decisão do Supremo na Ação, Barroso afirmou que, por se tratar de sua primeira intervenção sobre o mensalão, sentia-se no dever de fazer algumas considerações sobre o caso, o que ele chamou de “pré-compreensões” sobre o tema. De início, o ministro afirmou ser um desperdício a mobilização em torno do julgamento se não ocorrerem “providências urgentes” que viabilizem a reforma do modelo político brasileiro.
“A conclusão a que se chega, inevitavelmente, é que a imensa energia jurisdicional despendida no julgamento da AP 470 terá sido em vão se não forem tomadas providências urgentes de reforma do modelo político, tanto do sistema eleitoral quanto do sistema partidário”, disse o ministro. “Após o início do inquérito que resultou na AP 470, com toda a sua divulgação, cobertura e cobrança, já tornaram a ocorrer incontáveis casos de criminalidade associada à maldição do financiamento eleitoral, à farra das legendas de aluguel e às negociações para formação de maiorias políticas que assegurem a governabilidade”, disse.
Barroso observou ainda que a “catarse” representada pelo julgamento da AP 470 é um sinal da “fadiga institucional” que acomete o país. O ministro citou como exemplo hipotético a eleição de um deputado federal, que pode ser “modestamente” orçada em R$ 4 milhões enquanto que o limite máximo de remuneração de um servidor público é inferior a R$ 20 mil. “Com esses números, não há como a política viver, estritamente, sob o signo do interesse público”, disse.
O ministro Roberto Barroso não se furtou também de criticar o entendimento de que o mensalão se trata do maior caso de corrupção da recente história política do país. O ministro lembrou que, em termos de recursos públicos, o esquema envolveu o desvio cerca de R$ 150 milhões e de que o “custo moral e institucional” do episódio não deve relativizado. Disse também, contudo, que, a despeito de ser “impossível exagerar a gravidade e o ‘caráter pernicioso’ dos fatos ocorridos, é questionável a afirmação de se tratar do maior escândalo político da história”.
O ministro afirmou que a resposta dada pelo Supremo ao caso deve ser “celebrada”, mas que não se deve tratá-lo como algo isolado ou anômalo na vida política brasileira. “[…] não constituiu um evento isolado na vida nacional, quer do ponto de vista quantitativo (isto é, dos valores envolvidos) quer do ponto de vista qualitativo (da posição hierárquica das pessoas envolvidas)”, disse. Para Barroso, o episódio se insere na “tradição lamentável” do exercício da representação política no país. Em sua fala, o ministro fez questão de citar ainda em “ligeiro esforço de memória”, casos recentes de corrupção, e em pelo menos um deles com desvios bilionários de recursos.
Barroso atacou, sem se ater a exemplos, a politização do julgamento. “Não existe corrupção do PT, do PSDB ou do PMDB. Existe corrupção. Não há corrupção melhor ou pior. Dos ‘nossos’ ou dos ‘deles’. Não há corrupção do bem. A corrupção é um mal em si e não deve ser politizada”, disse.
Por fim, observou que a corrupção não se limita apenas à esfera pública e política, mas envolve ainda práticas privadas de empresas e cidadãos. Em uma consideração subjetiva, chegou mesmo a recomendar aos cidadãos que policiem em si próprios o que desprezam em altos dirigentes do país.
Rafael Baliardo é repórter da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Rodrigo Haidar é editor da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Fonte: Revista Consultor Jurídico