Ayres Britto toma posse no Supremo Tribunal Federal
O ministro Carlos Ayres Britto assumiu na tarde desta quinta-feira, 19, a chefia do Poder Judiciário e fica no cargo por sete meses sem um plano de metas e estratégias. No entanto, ele decidiu que seu mandato primará pelo diálogo aberto com juízes, representantes do Legislativo, do Executivo e de entidades diversas e com seus próprios colegas de Tribunal para articular assuntos de interesse do Judiciário. O perfil é uma guinada em relação ao padrão mais centralizador do antecessor, Cezar Peluso.
Entre os direcionamentos propostos por Britto estão a aproximação com os tribunais superiores e com instituições ligadas à Justiça, e uma maior participação dos colegas nos assuntos da Corte. Britto pretende, por exemplo, colher opiniões sobre a manutenção do rigoroso sistema de segurança implantado na gestão de Peluso e sobre critérios que restringem a transparência de processos, como o uso de iniciais para identificar investigados em inquéritos.
Preocupado com a autoestima dos juízes, Britto pretende direcionar seus esforços à frente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para mostrar que os “bandidos de toga” são exceção. Ele não chegou a definir ações específicas para restaurar a unidade da categoria, mas já é certo que defenderá uma postura menos “belicosa” com os magistrados por parte da corregedora Eliana Calmon. (Com Agência Brasil)
Acompanhe abaixo os principais momentos da cerimônia de posse:
16h30 – Cerimônia é aberta com a cantora Daniela Mercury cantando o hino nacional.
16h35 – Ayres Britto presta juramento e é empossado presidente do STF e do CNJ.
16h40 – Ministro Joaquim Barbosa presta juramento e é empossado vice-presidente do STF e do CNJ.
16h43 – Ministro Celso de Mello, decano do tribunal, assume a palavra. Após destacar que Ayres Brito é o quinto sergipano a ocupar uma cadeira no STF, Celso de Mello resume o currículo acadêmico e profissional do novo presidente do STF.
E discursa: ”É importante reconhecer a significativa participação de Vossa Excelência na construção, por essa corte, de uma expressiva jurisprudência das liberdade, que resultou em julgamentos emblemáticos, todos eles impregnados com a marca inconfundível de seu talento, competência e sabedoria, nos quais o STF resolveu questões revestidas da maior transcendência social, jurídica e política, em favor de grupos minoritários e vulneráveis e em defesa dos valores da igualdade da afetividade, liberdade, ancestralidade dos povos indígenas e da moralidade das práticas administrativas. Suas decisões serão sempre rememoradas, como aquela a versar sobre a liberdade da pesquisa de células troncos embrionárias, permitindo que essa corte discutisse o alcance e o sentido da vida e da morte, lembrando que o direito de nosso país foi erguido sob a égide de um Estado laico e democrático”.
Em seguida, Celso de Mello lembra as decisões tomadas com votos relevantes apresentados por Ayres Britto sobre as pesquisas sobre as células troncos, união estável homoafetiva, contra a prática do nepotismo, que rejeitou a Lei de Imprensa editada no regime militar e sobre a demarcação de terras indígenas.
Celso de Mello também nega que o STF invada a competência do Legislativo e do Executivo em julgamentos polêmicos. “O que se mostra imperioso proclamar é que nenhum poder da República tem legitimidade para desrespeitar a Constituição, ou para ferir direitos públicos ou privados de qualquer pessoa. Nenhum poder da República é imune ao império das leis e à força hierárquica da Constituição. É preciso lembrar muitas vezes que os dispositivos da Constituição são feridos pela omissão dos poderes públicos, e coloca-se nesse ponto a grave questão que essa Suprema Corte tem consciência, relativa ao inaceitável desprezo pela Constituição decorrente de comportamentos estatais omissivos, que ferem por inércia a autoridade suprema da lei do Estado e viola a noção de sentimento constitucional. Não se alega, nesses casos, a verificação de ativismo judicial por parte do STF, especialmente porque dentre as inúmeras causas que justificam esse poder afirmativo do Poder Judiciário, práticas de ativismo judicial, embora moderadamente exercida pela Corte Suprema em momentos específicos, tornam-se uma necessidade institucional quando os órgãos do Poder Público se omitem ou retardam o cumprimento das obrigações às quais estão sujeitos. E o Poder Judiciário não pode aceitar uma posição de pura passividade“.
17h15 – Roberto Gurgel, procurador-geral da República, faz pronunciamento em nome do Ministério Público.
“Há dois anos, Vossa Excelência, ministro Ayres Britto, despedia-se da presidência do TSE, e então tive a oportunidade de dirigir breves e necessárias palavras, que rememoro, citando Aliomar Baleeiro: ‘Também sou humano e não me alheio a nada que é o humano. Desgraçado dos países em que os juristas sejam apenas juristas’. O juiz asséptico é uma impossibilidade antropológica. E ficou no TSE a sua marca do artesão da palavra, do homem cordial e espirituoso, do excelente jurista. Este homem que assume com destemor e serenidade sergipanas a missão de liderar o Judiciário brasileiro num momento particularmente complexo.
Todos sabemos, mas é importante repetir, nas palavras da Sepúlveda Pertence, que não se construirá uma democracia de verdade sem instituições judiciárias fortes, porque respeitadas e capazes de impor seu papel de observância da ordem jurídica, desde ao simples cidadão até aos poderosos veículos de comunicação de massa, assim como a outros atores da Justiça, como o próprio Ministério Público. Como Vossa Excelência, gosto das pessoas orgânicas, vertebradas, que têm sangue da veia, que gostam do que fazem, que se comprometem com seu trabalho. O momento é de união e coesão. Ministério Público e Magistratura. Conselho Nacional do Ministério Público e Conselho Nacional de Justiça. Precisamos todos trabalhar juntos para dar continuidade ao aprimoramento de nosso sistema de Justiça e defender nossas prerrogativas constitucionais em seus mais variados aspectos.”
17h30 – Ophir Cavalcante, presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, assume a tribunal. Lembra que não hierarquia entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, pedindo que todos se relacionem com respeito e consideração. Em seguida, discursa, lembrando a expectativa sobre o julgamento do mensalão.
“Ainda que a passagem de Vossa Excelência pela presidência do STF seja curta, saiba que seu nome já está inscrito para sempre na Casa que abriga a consciência jurídica da nação. E o tempo não será curto para levar adiante processos sobre casos de corrupção que marcaram a nossa história recente. E digo ao novo presidente da Suprema Corte brasileira que a sociedade espera que esse tema não seja mais postergado, e que haja a punição exemplar dos culpados pelos crimes que cometeram contra o patrimônio público. Somente eliminando qualquer ideia de impunidade, podemos combater a corrupção, uma das maiores mazelas do nosso países.
Também precisamos refletir que, na origem de todos os casos de corrupção, está o modelo de financiamento privado da política, que permite o caixa 2, ou entre outras palavras, o relacionamento promíscuo entre o interesses privados e coisa pública. É sempre assim, inevitavelmente. E, quando um cai, arrasta junto de si bicheiros, falsificadores, policiais, governadores, parlamentares, projetos, obras e, o que é pior, a própria credibilidade das instituições.
O Congresso Nacional tornou-se, citando Monteiro Lobato, um pântano, onde muito de discute, mas nada é feito de concreto para melhorar o ambiente, que continua sendo o de um pântano. É preciso que se diga que nunca em sua história o Brasil teve uma democracia tão duradoura, prova da crença do nosso povo nesse sistema, mas precisamos avançar mais. A reforma política nunca avança, sendo constantemente freada pelas forças que se beneficiam dessa situação. Por isso, a OAB apresentou uma ação direta de inconstitucionalidade questionando a lei eleitoral que permite doações de empresas jurídicas privadas a candidatos. Esperamos mudanças nesse sentido, da mesma forma que ocorreu com a Ficha Limpa, que ao menos vai retirar da cena alguns atores que em nada enobrecem a arte de fazer política.
17h50 – Ayres Brittoassume a palavra: “Quem já se colocou à testa de qualquer dos poderes brasileiros fez o que fiz agora pouco: prestar compromisso de atuar nos marcos da Constituição e das leis. Com o registro especial para o ato de posse da presidente Dilma, que sob o atento olhar da própria história, se tornou a primeira mulher a titularizar o cargo de presidente da República, ungida pela pia batismal do voto popular.
Na primacial observância da Constituição e na obediência às leis é q reside a garantia de desempenho à altura dos respectivos cargos. E como dizer: basta cumprir fielmente a Constituição e as leis para se ter a antecipada certeza de êxito de tão honrosas e complexas investiduras.
É o que pensa o homem comum do povo, que aprendi com esse recente episódio. Retornava eu de um almoço domingueiro em Brasília, com minha mulher e minha filha, quando encontrei ao lado do nosso automóvel um homem que aparentava cerca de 30 anos de idade. Apresentava-se como guardador de carros, mas já o conhecia à distancia, como morador de rua. Ja o tinha visto em sua rede, erguida sob árvores, para embalar o abandono dele. E assim ele me dirigiu a palavra: – Ministro Ayres Brito, como o senhor vê, estou aqui cuidando de seu veículo para que ninguém danifique o patrimônio de sua família. Agradeci e procurei nos bolsos algum trocado para ele. Sem sucesso, nenhum dos três Brittos portava dinheiro, nem graúdo nem miúdo. Disse eu então a ele. Como o senhor percebe, desta feita vou ficar te devendo. Ele me fitou e altivo respondeu. Ministro, o senhor não me deve nada, não me deve nada ministro, basta cumprir a Constituição.
Fonte: Estadão