Agentes da PF ameaçam se alojar em delegacia

Policiais federais lotados na Delegacia de Altamira, no Pará, ameaçam se alojar com suas famílias na própria delegacia por falta de opção de moradia. Em documento encaminhado ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e ao diretor-geral do Departamento de Polícia Federal, Leandro Daiello Coimbra, eles afirmam que, com a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, a cidade assiste a uma vertiginosa alta inflacionária, o que provocou uma disparada nos aluguéis, criando uma situação inusitada.

O aumento do custo de vida no município, que se reflete em especial nos aluguéis, hotéis e pousadas, não afeta só os policiais, mas diversos servidores de outros órgãos federais. Um exemplo é o do procurador da República Bruno Alexandre Gutschow. “Eu entrei em fevereiro de 2010 pagando R$ 800 de aluguel, teve os reajustes de índice de IGPM que foi para R$ 900 e agora estão me pedindo R$ 3 mil”, diz.

Em março passado, o presidente em exercício, Bolivar Steinmetz, da Associação dos Delegados da Polícia Federal (APDF), encaminhou o documento ao ministro José Eduardo Cardozo e ao delegado Daielllo Coimbra. Na ocasião, Steinmetz deixou claro que a entidade, “movida pelo inescusável dever de solidariedade humana, declara irrestrito e total apoio aos servidores da Delegacia de Altamira e às decisões que legalmente vierem a adotar”. Como uma espécie de alerta, ele citou “um princípio de ordem operacional que diz: quem dá a missão, também dá os meios”.

Em seguida, frisou: “lembro a V. Exª. que às vezes, um minuto, ou mesmo uma atitude, tomada impensadamente, movida pelo desespero, pode ser suficiente para que se perca tudo que foi construído durante uma trajetória inteira, desvanecendo sonhos e atirando ao lixo projetos de vida pacientemente arquitetados”.

O documento pede providências às autoridades e apresenta uma reivindicação como saída para a situação. Os policiais sugerem que a direção do DPF e o Ministério da Justiça incluam Altamira no projeto de lei que está criando um adicional nos salários dos servidores federais lotados em regiões de fronteira, mesmo sendo um município no coração do estado do Pará, bem distante das fronteiras. A lei criará percentuais nos salários para compensar o deslocamento destes servidores

No abaixo assinado, os policiais lembram que a maioria dos servidores desta descentralizada são casados e possui família. “Caso não seja tomada nenhuma providência, teremos todos que mudar para esta descentralizada. Nossos contratos vencerão já nos próximos meses e não teremos outra alternativa senão desocupar os imóveis”, diz um abaixo assinado endossado pelos servidores da delegacia, cujo efetivo tem quatro escrivães, 15 agentes e três delegados.

Para melhor retratar a situação, citam nove casos de servidores cujos alugueis residenciais foram majorados no ano passado e devem sofrer novo aumento este ano, por força do mercado inflacionado na cidade. O escrivão Emerson, por exemplo, em 2010, pagava R$ 1 mil pelo aluguel da casa. No ano passado, foi obrigado a deixar o imóvel diante do novo valor pedido pelo proprietário: R$ 4.500,00.

Os R$ 3 mil que estão sendo cobrados do procurador é o mesmo valor que cobram da delegada chefe da delegacia do DPF, Patrícia Helena Shimada, que está na cidade há três anos. Seu aluguel era de R$ 900 em 2010, passou para R$ 1.650 no ano passado e agora estão lhe pedindo R$ 3 mil, segundo informações obtidas pela revista ConJur.

Na procuradoria da República, segundo Gutschow, alguns servidores tentam superar o problema do alto custo dos aluguéis dividindo residências. “Moram de dois em dois para suportar o alto custo do aluguel”, diz o procurador.

No abaixo-assinado, os policiais lembram que o DPF construiu casas funcionais em localidades de difícil provimento, mas não o fez em Altamira. Esta não seria uma solução para o problema pois, como afirmaram, “nosso caso é urgente, já para os próximos meses. Essas casas funcionais, caso sejam construídas, atenderão às necessidades dos servidores que vierem nos próximos concursos, pois até ficarem prontas já estaremos todos na “rua””.

Apesar de nenhuma resposta ao ofício ter sido dada oficialmente nestes três meses, nenhum policial mudou-se para a delegacia. Mas nela têm dormido agentes enviados a Altamira para operações especiais, na maioria das vezes de repressão a crimes contra o meio-ambiente.

Eles esbarram na questão dos preços cobrados na cidade. Com uma diária de R$ 177,00 para hospedagem e alimentação não conseguem fazer frente às tarifas de hotéis e pousadas locais: nos mais baratos, na periferia da cidade, a pernoite sai em torno de R$ 140,00. Nos melhores, fica acima de R$ 200,00.

A tendência é de a situação piorar ao longo do tempo. Hoje, o Consórcio de Construção de Belo Monte (CCBM) tem aproximadamente 6.000 empregados e a previsão é que a cada ano mais 6.000 operários sejam incorporados à obra até atingir 30 mil empregos diretos em 2015.

Sem infraestrutura adequada para receber tantos “novos moradores”, a cidade passa por dificuldades. Nos últimos anos, segundo cálculos modestos, chegaram mais de 30 mil pessoas. Na descrição feita pelo procurador da República, a situação não tem sido fácil.

O custo de vida também afeta a alimentação que, na maioria das vezes, depende da condição da estrada Transamazônica, totalmente de barro. Períodos de chuva comprometem o abastecimento da cidade provocando até a falta de água mineral. Por lá, um litro de gasolina não sai por menos do que R$ 3,00.

“O crescimento da cidade é notório. Estive no canteiro de obras da Usina que ainda são poucas as residências por lá. A ideia é que as pessoas morem lá. Mas as residências para os operários não estão prontas. Têm muito poucas prontas. Então todos eles estão morando aqui. São milhares de pessoas que estão aqui adicionadas. Fora estes, que estão empregados, o pior são os que não estão empregados, que vieram para Altamira na expectativa de um emprego. E todas as repercussões indiretas disso, com aumento de comércio, aumento de tudo o mais. A estrutura da cidade é absolutamente a mesma. Então é um caos. Até caminhar aqui está difícil. As calçadas com obstruções, as pessoas têm que caminhar na rua e as ruas estão cheias de carros, motos, bicicletas. Está realmente um caos”, diz.

Fonte: Consultor Jurídico

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