Sem a confiança do Planalto, Temer se afasta de Dilma

Michel Temer
Michel Temer

O vice-presidente Michel Temer se impôs um distanciamento do centro do poder, mantendo-se há semanas em reserva quase absoluta. Além de ouvir conselhos de seus aliados, que recomendavam que ele se resguardasse exatamente por ser a alternativa direta de poder em caso de impeachment, Temer percebeu os sinais da presidente Dilma Rousseff e de ministros petistas de que sua presença deixou de ser considerada importante para a garantia da governabilidade, passando a ser um incômodo. A relação do peemedebista com a cúpula palaciana nunca foi de confiança plena. Mas pessoas próximas a ele relatam que o clima entre ele e a presidente Dilma passou a ser de permanente mal-estar e com ministros petistas, de desconfiança aberta e constrangimento.
Ao contrário da postura adotada até o início do mês passado, quando participava de eventos e dava entrevistas falando sobre as ações e desacertos do governo, o vice-presidente da República quase não tem aparecido em público, e até os almoços e jantares privados em sua residência oficial se tornaram menos frequentes. Em seu gabinete, num prédio anexo ao Palácio do Planalto, a movimentação de políticos, no entanto, se mantém intensa. Temer segue ouvindo e aconselhando aliados, mas evita ajudar diretamente o governo em questões cruciais, como a eventual abertura de um processo de impeachment contra Dilma. Quando chamado a opinar sobre o assunto, o vice não se aprofunda.
Foi o que aconteceu na última terça-feira, durante reunião da coordenação política do governo. O ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) chegou ao gabinete de Dilma com a liminar concedida pelo ministro Teori Zavascki (STF). A análise inicial de Cardozo e outros ministros que o cercaram para ler o documento era de que o Supremo estava paralisando o andamento de qualquer ação relacionada ao impeachment. Temer procurou não se envolver, mas, convidado a opinar, disse superficialmente que não tinha a mesma interpretação e que a liminar deveria ser lida com mais “cautela”. Horas depois, o Planalto percebeu que a decisão de Teori tratava do rito definido pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para o pedido de afastamento, mas seu direito de deferir ou indeferir a abertura do processo estava plenamente assegurado.
— Ele não se aprofunda sobre o tema impeachment porque o núcleo político que cerca a presidente tem convicção de que ele está conspirando. Chega a alguma rodinha formada por esses ministros e a conversa muda rapidamente, como se ele não percebesse. Temer não lavou as mãos, o que ocorreu é que lavaram as mãos dele — relatou ao GLOBO uma pessoa próxima do vice-presidente.
Apesar de ministros palacianos acreditarem que o vice conspira para tomar o lugar de Dilma, sempre que questionado sobre o avanço do impeachment por aliados, ele afirma que é difícil sustentar uma ação deste porte juridicamente. E mais, já viu contagem de votos de peemedebistas mostrando margem para a abertura do processo no plenário da Câmara e discorda, afirmando que não há, hoje, possibilidade de isso se concretizar.
O distanciamento de Temer deve ser duradouro. Desde que teve sua atuação esvaziada na articulação política pela presidente, o vice buscou construir uma “narrativa da saída” do núcleo central do governo. Foi nesse momento, no início de setembro, que fez a última série de críticas abertas ao governo, quando disse inclusive que era difícil a presidente Dilma “resistir” mais três anos e meio com popularidade tão baixa e clamou que era “preciso melhorar o que está aí”.
O distanciamento foi reforçado há três semanas, quando Dilma decidiu pilotar pessoalmente as negociações da reforma ministerial, chamando o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (PMDB-RJ), para oferecer duas pastas na Esplanada em troca de votos contra o impeachment e a favor do ajuste fiscal. Presidente do PMDB, Temer se sentiu novamente esvaziado.
Na semana passada, quando Eduardo Cunha pediu ao Planalto a ida do vice para o Ministério da Justiça, no lugar de José Eduardo Cardozo, pessoas próximas a Temer trataram a ideia como algo irrealizável. Ele jamais aceitaria nova missão já tendo sentido na pele a falta de autonomia que lhe seria reservada.
— Além da falta de autonomia, ele foi boicotado quando esteve à frente da articulação. Por que se posicionar politicamente agora se sua posição é vista com ambiguidade? O melhor a fazer é o que Temer está fazendo: se preservar de qualquer disputa — afirmou um amigo do vice-presidente.
Aos aliados, Temer tem demonstrado desconforto com a situação vivida e preocupação com a crise política permanente. Soma-se a esses dois fatores a dificuldade de o governo se desvencilhar dos problemas que aparecem quase que diariamente. O vice deixou claro a Dilma, nas últimas semanas, não estar mais disposto a atuar no front das negociações políticas com o Congresso, mas disse que trabalhará em temas da agenda econômica e do ajuste fiscal. Segundo aliados, o intenso fogo amigo sofrido quando fiador de negociações políticas deixaram marcas.
— Ele negociou as votações do primeiro semestre usando seu crédito pessoal. Alguns deputados entenderam isso quando as promessas não foram cumpridas, mas outros, não — relatou um peemedebista próximo a Temer.
Fonte: O Globo

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