SUS – Conselho de Saúde denuncia péssimo atendimento ao MPE
Imagine você ter que acompanhar um parente que precisa de atendimento médico urgente. Chegando ao Pronto Socorro Municipal (PSM), após uma imensa espera, intermináveis horas, a pessoa que você acompanha é finalmente atendida. Na sequência, você recebe a informação de que é preciso aguardar novamente e permanecer nas dependências do PSM, e sem local adequado, o paciente é mantido em uma maca no meio do corredor, que por sua vez está completamente lotado de pacientes que também aguardam atendimentos, sem qualquer garantia que receberão atendimento adequado. Com o paciente que você acompanha sentido fortes dores no peito, na região do tórax, a única medicação que administram é a Dipirona. Não há solicitação de nenhum tipo de exame adicional que possa identificar uma cardiopatia, por exemplo.
“Aquele ambiente é feito para pessoa piorar, não para melhorar. A gente recorre ao SUS porque não temos dinheiro para pagar particular. Minha filha teve que me retirar de lá, se não era capaz de eu ter morrido”, afirmou um paciente à nossa equipe de reportagem.
Esta cena é apenas uma das inúmeras que acontecem todos os dias nos estabelecimentos municipais de saúde do Município de Santarém, oeste do Pará. A redução de salário e aumento de carga horária de trabalho dos profissionais de enfermagens, falta de pagamento de fornecedores, estrutura precárias nas Unidades Básicas de Saúde, principalmente nas especializadas, e a falta de medicamentos para diversos programas de assistência garantida em lei, foram apenas umas das situações diagnósticas pelo Conselho Municipal de Saúde de Santarém, que nesta semana resolveu acionar o Ministério Público.
CALAMIDADE PÚBLICA: Devido às inúmeras denúncias de descaso com a saúde do santareno, o Conselho Municipal de Saúde (CMS) emitiu nota quanto ao assunto:
O Conselho Municipal de Saúde de Santarém vem por meio desta nota, manifestar para a sociedade Santarena, bem como para os Trabalhadores de Saúde, a sua indignação com a atual situação de calamidade e descalabro que está submetida à saúde pública do Município. Está visível e cada vez mais insuportável a falta de medicamentos, materiais e insumos para a manutenção dos serviços de saúde hospitalar, nas unidades básicas de saúde, como também, nos centros de referência em assistência especializada (mulher, criança, idoso), incluindo os serviços de Hemodiálise e de Testagem Anônima- HIV/AIDS e Hepatites.
O Colegiado avalia a postura inadmissível demonstrada pelo Prefeito e pelo Secretário Municipal de Saúde, que proporcionam à sociedade em geral, o cenário aterrador a que os Usuários e Trabalhadores de Saúde vêm sendo submetidos diariamente, devido à precariedade dos vínculos, sobrecarga de trabalho, falta de equipamentos de proteção e insumos básicos para o atendimento dos pacientes, baixos salários, desvalorização profissional e cortes bruscos de gratificações e plantões, prejudicando, sobremaneira, toda a categoria de trabalhadores, o que reflete na prestação inadequada do serviço à população. Tal postura de descaso, afeta diretamente direitos da população que deixa de receber uma assistência à saúde humanizada, ferindo de maneira gravosa, garantias constitucionais.
Denunciamos, ainda, o descaso do Secretário Municipal de Saúde, que não tem assegurado as condições necessárias para que este colegiado realize plenamente os trabalhos de controle e fiscalização, e tem dificultado a manutenção deste colegiado, chega ao absurdo de atingir sua funcionabilidade pela falta de coisas básicas, tais como: materiais de expedientes, falta de internet, telefone, água, entre outros.
Desta feita, repudiamos a postura do prefeito Alexandre Von em emitir um decreto com essência autoritária e centralizada, o qual retira toda autonomia do Secretário Municipal de Saúde e Centraliza as decisões sobre a sua pessoa, dificultando a operacionalização dos serviços, prejudicando com isso, os fornecedores e prestadores de serviços que deixam de receber em dia pelas prestações de serviços e fornecimentos realizados.
Manifestamos a toda população e à classe trabalhadora do SUS que este colegiado está oficializando denúncia aos Ministérios Públicos Estadual e Federal, aos Colegiados Gestores, aos Conselhos de Saúde Estadual e Nacional, com vista a encontrar o apoio necessário na defesa de todos os Usuários do Sistema Único de Saúde, para que tenham seus direitos defendidos e respeitados os ditames constitucionais acerca do princípio da dignidade da pessoa humana e aos direitos e garantias fundamentais insculpidos em nossa Constituição Cidadã.
A manifestação do CMS retrata o quão grave está à situação do SUS em Santarém. Sem gestão adequada, sem comprometimento dos gestores públicos na solução das dificuldades encontradas diariamente pelos santarenos, pessoas estão tendo os seus direitos subtraídos. A inércia parece não ter fim.
MPE ACIONA A JUSTIÇA: O débito de R$ 9 milhões em repasses obrigatórios do Estado do Pará à Secretaria Municipal de Saúde de Santarém levou o Ministério Público de Santarém a ingressar com Ação Civil Pública contra o Estado, requerendo medida liminar que determine o bloqueio judicial do valor devido. O atraso se acumula desde o ano de 2013 e prejudica a prestação do serviço em saúde no Município, cujos atendimentos mensais no Hospital Municipal chegam a 16 mil.
A ACP foi ajuizada no dia 16/12/2015, por meio da 8ª e 9ª Promotorias de Justiça de Direitos Constitucionais de Santarém ao Juízo da 6º Vara Cível de Santarém. O total de repasses atrasados é de R$9.012.674,99.
Os valores são previstos no artigo 198 da Constituição Federal, pelo qual devem os Estados garantir 12% de suas receitas para o financiamento à saúde. Os atrasos são das parcelas mensais que o Estado deve repassar ao Município.
A promotora de justiça Lilian Braga, que assina a ação, ressalta que os dados apurados indicam que a não regularização pode causar o colapso total da assistência em saúde, incluindo o atendimento aos 334 pacientes que se encontram atualmente internados no Hospital Municipal. O débito do Município com fornecedores soma R$ 8.732.950,28, sendo R$ 369.918,32 referentes ao fornecimento de alimentos e o restante, de insumos e medicamentos.
O MP requer a determinação de liminar para que seja bloqueado o valor total de R$ 9.012.674,99, a ser suportado por conta bancária da Secretaria de Saúde do Estado do Pará. E que do valor bloqueado seja transferido ao Fundo Municipal de Saúde de Santarém o valor referente à alta complexidade, no total de R$ 7.292.300,00.
E ainda que seja o Estado obrigado a manter a regularidade dos repasses obrigatórios ao Município na área da saúde. O MP sugere aplicação de multa diária pessoal ao Governador do Estado e ao Secretário Estadual de Saúde, no valor de R$ 10 mil em caso de descumprimento.
No pedido final, requer a confirmação dos pedidos liminares e a condenação do Estado na obrigação de repassar ao município de Santarém o valor do débito que for apontado por ocasião da sentença condenatória, relativos à Atenção Básica, Média e Alta Complexidade, Assistência Farmacêutica, Vigilância Sanitária e Hemodiálise.
COLAPSO: Todos os números foram apurados e confirmados pelo MP por meio de oitivas e documentos que estão anexados na ação, incluindo ata de reunião realizada no dia 15 de dezembro, na qual o Município e o Conselho Municipal de Saúde registraram “o colapso do sistema de saúde pública em Santarém caso o Estado do Pará não regularize a transferência dos recursos financeiros”.
O município de Santarém disponibiliza para atendimento de quase 300 mil habitantes, um Pronto Socorro Municipal, uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), 26 Unidades Básicas de Saúde na zona urbana e 22 na zona rural.
O Hospital Municipal realiza em média 16 mil atendimentos mensais, divididos em internações e pronto socorro. A UPA registra em média 6.225 atendimentos mensais.
O MP ressalta que todas as tentativas já foram realizadas pela municipalidade para receber os recursos, sem resultado efetivo, e que não há justificativa para o atraso. A concessão dos pedidos liminares é necessária “para evitar colapso do serviço de saúde pública no Município de Santarém, acarretando além da falta de medicamentos/insumos, greve de médicos/funcionários do Hospital e de inviabilizar a prestação de serviços de saúde pública local”.
Por: Edmundo Baía Junior
Fonte: RG 15/O Impacto