Sespa não fornece medicamento e pacientes renais correm risco de morte

Pacientes renais denunciam descaso e já comunicaram situação ao Ministério Público

O descaso do governo do Estado com a saúde pública de Santarém e demais municípios da região Oeste do Pará está passando dos limites. Essa falta de atenção fez com que o prefeito Nélio Aguiar devolvesse a responsabilidade do serviço de hemodiálise para o governo do Estado, que não estava repassando recursos para esse tipo de tratamento para o município de Santarém.

Agora um fato que está deixando muita gente preocupada, é que o tratamento pós-transplante dos renais crônicos está prejudicado no município de Santarém. De acordo com a associação que representa os pacientes na região, a Secretaria de Estado de Saúde (Sespa) anunciou a falta do medicamento Tacrolimo 1 e 5 mg. O remédio é essencial para que o organismo não rejeite os órgãos transplantados. A informação foi feita por meio de uma nota enviada por e-mail ao presidente da Associação dos Renais Crônicos do Oeste do Pará. O documento apresentava os motivos pelos quais o fornecimento do medicamento foi prejudicado.

Para o presidente da entidade, Miguel da Conceição, que fez o transplante há quatro anos, a falta do medicamento pode colocar mais pessoas na fila para receber um novo órgão e aumentar os problemas com a falta do Tacrolimo. “Para muitos de nós, se não chegar em tempo hábil, vai haver rejeição e perda do órgão. Vai ter que passar por novas cirurgias e voltar para a fila da hemodiálise”, declarou Miguel da Conceição, explicando que apesar de ter outras medicações que auxiliam na não rejeição do órgão transplantado, é o Tacrolino o imunossupressor capaz de evitar esse processo. O caso já foi comunicado ao Ministério Público Estadual.

Com o estoque de comprimidos acabando, quem necessita do remédio está receoso. “Eu só tenho para essa semana. Segundo o enfermeiro responsável pelo transplante e hemodiálise, a partir do dia 8 estaria disponível o remédio, mas hoje eu fiquei sabendo que não vai ter esse medicamento. Eu não sei como fazer para conseguir ele, porque para comprar é difícil”, disse o paciente transplantado, Miler de Sousa.

Há 27 dias, Vilmar de Sousa realizou o transplante de rim, vencendo uma das barreiras impostas pelo problema de saúde. Ele estava preocupado também porque os últimos comprimidos estão chegando ao fim. “Eu passei 10 anos na máquina de diálise e não quero voltar para esse tratamento chato por causa da irregularidade dele”, ressaltou.

A Sespa esclareceu que o Tacrolimo é fornecido pelo Ministério da Saúde e que o órgão deve se manifestar oficialmente. Mas, enquanto o Ministério da Saúde não encaminhar essa medicação, a Sespa deve procurar solucionar o problema de forma emergencial comprando o remédio para não prejudicar o tratamento dos pacientes.

SERVIÇO DE NEFROLOGIA TRABALHA ACIMA DA CAPACIDADE: Em maio deste ano, nossa reportagem fez uma matéria sobre os pacientes de doenças renais crônicas da região oeste do Pará, que precisam realizar hemodiálise, têm enfrentado muitas dificuldades nos últimos anos. É que a capacidade de atendimento tornou-se insuficiente, diante do aumento exponencial da demanda.

Em Santarém, que recebe pacientes de toda a região, o tratamento de hemodiálise é realizado em duas unidades de saúde. No Hospital Regional do Baixo Amazonas (HRBA) e no Centro de Nefrologia Municipal, que fica localizado nas dependências do Hospital Municipal de Santarém (HMS). O serviço é de responsabilidade do Governo do Estado, porém, o Município mantinha um convênio junto à gestão estadual, para prestar o serviço no âmbito do HMS.

Para o médico nefrologista Júnior Aguiar, responsável pelo Serviço de Nefrologia Municipal, o atendimento prestado pela unidade, com as atuais quantidades de máquinas, atendendo em quatro turnos, dá sinais de saturação. “Na verdade, a doença renal crônica que é a insuficiência renal, tornou-se uma endemia nacional. Atualmente existe um grande número de pacientes, e a cada dia essa população de pacientes com problemas renais crônicos aumenta, e Santarém não está fora desse contexto. O Serviço de Nefrologia do Hospital Municipal é o único de porta aberta para toda região Oeste do Pará, ou seja, são entre 19 a 20 municípios que dependem desse serviço, e isso causou uma sobrecarga do serviço. Temos uma quantidade de pacientes acima da capacidade. Para se ter uma ideia, basicamente 60% dos usuários desse serviço são oriundos de Santarém e cerca de 40% são de outros municípios da região, que entram pelo Hospital Municipal, e havendo necessidade de fazer hemodiálise, acabam vindo para o nosso serviço, mas como não temos vagas, eles continuam internados. A verdade é que não temos condições. Nosso serviço de hemodiálise em Santarém é o primeiro passo e, como estamos de porta aberta, não podemos negar esse tratamento. Então, os pacientes adentram, são submetidos à hemodiálise, e ficam aguardando a vaga de crônico definitiva que pode ser tanto no Hospital Municipal quanto no Hospital Regional”, informou Dr. Júnior Aguiar.

O médico nefrologista, que também é presidente do Conselho Municipal de Saúde, disse, na ocasião, que o problema tem sido debatido constantemente no colegiado, que realizou diversos encaminhamentos. E mesmo o tratamento sendo de responsabilidade do Estado, trabalha para minimizar a falta de estrutura, prezando acima de tudo pelo atendimento humanizado aos pacientes.

“Solicitamos da gestão municipal e estadual, providências para conseguirmos suprir, essa demanda crescente. Algumas ações já foram realizadas, como a abertura do quarto turno, tanto no Hospital Municipal quanto no Hospital Regional, que é fruto dessas discussões. Mas é claro que a abertura de quarto turno não é suficiente. No dia 30 de maio, o Conselho Municipal de Saúde fez uma reunião, aonde se discutiu o assunto nefrologia em uma abordagem mais complexa, como a ampliação do setor e criação de novas vagas e serviços. Aqui no Hospital Municipal, nós temos um projeto físico para ampliação, mas isso precisa de planejamento. Mantemos sempre contato com a enfermeira Marcela Tolentino, que é a diretora da 9ª Regional de Saúde. Ela sempre tem se demonstrado uma parceira”, expôes o médico nefrologista.

PREVENÇÃO: Que fatores têm contribuído para o aumento de pacientes renais crônicos? Como a população pode evitar o acometimento da doença? Doutor Júnior explica que os pacientes que precisam de hemodiálise, em sua maioria são portadores de outras doenças crônicas, especialmente diabetes e hipertensão.

“É importante cuidar dos rins e para os hipertensos e diabéticos é fundamental o controle do sistema urinário e do sistema renal, porque 90% dos pacientes que fazem hemodiálise são diabéticos ou hipertensos. Essas doenças sãos as que mais levam à insuficiência renal crônica. Todo paciente que é diabético e hipertenso deve ficar atento aos rins, e à ingestão de água. Nossa região é muito quente, então, transpiramos muito, sendo assim, o ideal é ingerir bastante líquido, cuidar da pressão, não usar medicamentos sem receita médica, por exemplo, os Anti-inflamatórios agridem os rins. São alguns cuidados básicos que se deve ter, e ao observar qualquer problema renal, procurar o seu médico, o posto de saúde mais próximo, e ser encaminhado para um nefrologista. Porque depois que o paciente já chega com a doença renal crônica instalada, a única coisa que podemos oferecer é a hemodiálise. Não tem como reverter a doença renal e se torna uma fase muito mais complexa”, disse o médico, acrescentando sobre os sintomas: “ Todo mundo que procura um nefrologista, procura pela dor, e na maioria das vezes a dor é lombar de origem óssea ou articular, dor de coluna, não é uma dor de rim. Oriento a todos que o rim só dói se ele tiver pedra ou se ele tiver infeccionado, e ele pode paralisar e a pessoa não sentir dor. Então, dor não é o melhor sintoma para você procurar o nefrologista. Nesse caso, quais são esses sintomas? É qualquer alteração urinária, urina com sangue, urina que espuma, inchaço, edemas de membros inferiores, aumento da pressão, esses são os sintomas e sinais que podem demonstrar um problema renal”.

APOIO PSICOLÓGICO: Segundo o médico Júnior Aguiar, os pacientes que recebem o diagnóstico para hemodiálise, comumente têm dificuldades de aceitar. Internalizam o temor com a perspectiva de terem a vida atrelada e dependente de uma máquina. Para que o tratamento aconteça a contento, os pacientes têm que contar com o apoio da família, e se possível com orientação com psicólogos.

“A gente entende que o diagnóstico da doença renal crônica, é um diagnóstico difícil. Você imaginar que pode ficar preso a uma máquina, que irá se tornar dependente dela, é uma situação difícil de qualquer um aceitar. Essa condição mexe um pouco com o psicológico. As condições em que eles estão se submetendo, diante das dificuldades com relação à quantidade de máquinas e de vagas, acredito que foi um momento de desabafo desse paciente, e a gente está esclarecendo que não se trata da forma de como ele foi atendido ou tratado, por exemplo, nós recebemos uma auditoria da SESPA ano passado, e a equipe de enfermagem foi avaliada por 17 pacientes de bom a excelente, ou seja, nenhum dos pacientes ouvidos pela equipe de auditoria da SESPA classificou o atendimento da equipe enfermagem como ruim. Foi um momento de muito estresse e a gente acaba entendendo porque sabe que o paciente passa por um momento muito difícil. Não há prioridade com relação aos pacientes do município. Todos são considerados pacientes, independente da sua origem, são tratados da mesma forma e são submetidos às mesmas condições de tratamento”, explica o médico.

DOENTES RENAIS CRÔNICOS COBRAM CONSTRUÇÃO DO CENTRO DE NEFROLOGIA EM SANTARÉM: No mês de maio do ano passado, o MPE de Santarém ajuizou ação civil pública contra o Estado do Pará, para a construção de um centro de Nefrologia no município, e para a implantação do quarto turno do serviço de hemodiálise no hospital regional do Baixo Amazonas. A ACP foi ajuizada pela 8ª promotoria de justiça de Direitos Constitucionais – Educação e Saúde. O município de Santarém é polo de atendimento para os municípios do oeste do Pará e desde 2012 o MPE atua na tentativa de melhorar o serviço, em conjunto com a Associação dos Doentes Renais Crônicos do Oeste do Pará (ARCOP).

Da solicitação do MPE, apenas foi efetiva a implantação do quarto turno no Hospital Regional. O turno extra seria a solução de curto prazo, considerando que a Organização Mundial de Saúde prevê o aumento em 10%, a cada ano, do número de pacientes renais crônicos. Então, a solução seria a criação de um Centro de Nefrologia, que é uma unidade certificada como os Hospitais de Ensino, que oferecem todos os atendimentos necessários aos portadores de doença renal, incluindo ambulatório, internação e todas as modalidades de diálise.

Fonte: RG 15/O Impacto

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