Primeiramente cumpre destacar que o PECA previsto na IN 1169/2011 tem previsão legal com hipóteses taxativas, não podendo a Receita Federal do Brasil RFB aleatoriamente reter mercadorias e sem motivação concreta do ato administrativo dar início ao procedimento, que acarreta altos custos com armazenagem, demuurage, multas entre outros prejuízos.
Uma coisa é o exercício regular do direito de fiscalização e poder de polícia e outro é o desvio/abuso de poder da Autoridade Aduaneira, que muitas vezes e de forma ilegal faz a retenção de mercadorias importadas sem justo motivo e abusando do poder de fiscalização, extrapolando os limites legais.
Não pode a RFB parametrizar automaticamente para o canal cinza e iniciar PECA sem a motivação legal.
Isso porque, o procedimento especial de controle aduaneiro (PECA) é regulamentado pela IN RFB nº 1.169/2011, aplicável “a toda operação de importação ou de exportação de bens e de mercadorias sobre a qual recaia suspeita de irregularidade punível com a pena de perdimento” e tem prazo de 90 dias para conclusão, prorrogável por igual período (diferentemente dos canais verde, amarelo e vermelho, que têm prazo de 8 dias para conclusão, a teor do art. 4º do Decreto nº 70.235/72).
O art. 2º da IN RFB nº 1.169/2011 arrola as situações de irregularidade que podem ensejar a instauração do PECA
Além disso, o art. 4º da referida Instrução Normativa estabelece que o PECA será formalmente instaurado mediante termo de início, através do qual se dará ciência à pessoa fiscalizada, e conterá, necessariamente, informações acerca das possíveis irregularidades que motivaram sua instauração e das mercadorias ou declarações objeto do procedimento, dentre outras.
Portanto, analisando os dispositivos citados, conclui-se, que a seleção de determinada operação de importação para o canal cinza de conferência aduaneira pressupõe a existência de elementos indiciários de fraude e enseja, necessariamente, a instauração formal do procedimento fiscalizatório de que trata a IN RFB nº 1.169/2011, de modo a assegurar o direito de defesa ao fiscalizado.
Dessa forma, muito embora a parametrização para o canal cinza e a instauração do PECA se destinem à apuração de irregularidades “inclusive no que se refere ao preço da mercadoria”, exige-se, para tanto, que a suspeita de subfaturamento da operação venha calcada em indícios objetivos da ocorrência de fraude, como a falsidade material dos documentos apresentados no despacho aduaneiro.
Isso porque o subfaturamento isolado da operação, praticado mediante falsidade ideológica, não enseja a aplicação da pena de perdimento, mas sim a imposição da pena de multa prevista pelo art. 108 do Decreto-Lei 37/66 (art. 703 do Regulamento Aduaneiro) e, portanto, não autoriza a instauração de PECA.
Assim, se o procedimento de fiscalização foi iniciado informalmente, sem a devida fundamentação (explicitação dos motivos e fundamentos que conduziram o agente público à elaboração do ato administrativo), por si só, já se revela a ilegalidade dos atos de retenção praticados.
Desse modo, como o subfaturamento não autoriza a instauração de PECA por não atrair a aplicação da pena de perdimento, não se justificava a retenção das mercadorias dos Importadores.
Posto isto, considerando eventual ilegalidade na retenção de mercadorias nos casos de Subfaturamento e demais casos que não ensejam a aplicação de pena de perdimento, as empresas importadoras fazem jus ao ressarcimento das despesas suportadas com a ilegal retenção de suas mercadorias, proporcional aos dias em excesso.
Nesse sentido:
ADUANEIRO E TRIBUTÁRIO. INDENIZAÇÃO. DESPESAS COM TAXA DE ARMAZENAGEM DE MERCADORIAS E DEMURRAGE. EXCESSO DE PRAZO PARA A CONCLUSÃO DO DESPACHO ADUANEIRO. PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA. 1. Inexistindo prazo específico para os atos que compõem o despacho aduaneiro, deve ser observado o prazo de oito dias, estabelecido para execução de atos no âmbito do processo administrativo fiscal pelo art. 4º do Decreto 70.235, de 1972. 2. Tendo extrapolado, injustificadamente, os prazos relativos ao despacho aduaneiro, a União deve indenizar os gastos que a parte autora teve com as despesas relativas à taxa de armazenagem das mercadorias e demurrage, proporcionalmente aos dias em excesso. 3. A Autoridade Aduaneira deve pautar o seu agir pela observância ao princípio da eficiência, nos termos do previsto no art. 37 da Constituição Federal. (TRF4, AC 5014261-15.2015.404.7208, SEGUNDA TURMA, Relatora LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH, juntado aos autos em 24/05/2017)
TRIBUTÁRIO E ADUANEIRO. IMPORTAÇÃO. PARAMETRIZAÇÃO DA DI. CANAL VERMELHO. PROSSEGUIMENTO DO DESPACHO ADUANEIRO. EXCESSO DE PRAZO. INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS. No que se refere à questão dos prazos legais considerados pela jurisprudência para o transcuro regular do despacho de importação, nota-se uma tendência à uniformização dos oito dias previstos no Decreto n. 70.235/72, que dispõe sobre o processo administrativo fiscal. Não havendo justificativa plausível para a inércia da Administração no período que mediou entre o registro da declaração de importação e o início das etapas do despacho aduaneiro, deve-se reconhecer a ineficiência do serviço público prestado e o direito ao ressarcimento das despesas havidas com a armazenagem e manutenção dos produtos nesse período. (TRF4, AC 5017110-23.2016.404.7208, SEGUNDA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 09/08/2017)
TRIBUTÁRIO. IMPORTAÇÃO. LIVROS INFANTIS. ÁLBUM DO BEBÊ. CLASSIFICAÇÃO TARIFÁRIA. INTERRUPÇÃO DO DESPACHO ADUANEIRO. DESPESAS DE ARMAZENAGEM E DEMURRAGE. HONORÁRIOS. 1. (…) 2. Comprovado o equívoco da Receita Federal na classificação da mercadoria importada pela autora, resta confirmada a procedência do feito. Precedentes desta Corte. 3. Apelo da parte autora provido para reconhecer seu direito ao ressarcimento das despesas de armazenagem e demurrage, a partir da data da interrupção indevida do despacho aduaneiro. (TRF4, APELREEX 5015388-65.2013.404.7205, SEGUNDA TURMA, Relator RÔMULO PIZZOLATTI, juntado aos autos em 26/02/2015).
Vejam que pelas recentes jurisprudências, fazem jus a devida indenização para ressarcimento dos danos, despesas de armazenagem, demurrage entre outras apuradas todos aqueles Importadores que tiverem suas mercadorias retidas indevidamente por suposto Subfaturamento, bem como casos de retenção por suposto erro de classificação fiscal e ainda excesso de prazo na conclusão do despacho, incluindo caso de greve e operação padrão.
AUGUSTO FAUVEL DE MORAES – Sócio do Escritório Fauvel e Moraes Sociedade de Advogados, Presidente da Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP
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