Felicidade por um fio | OPINIÃO – SEM SPOILERS

Felicidade por um fio

(Nappily Ever After)

Por: Allan Patrick

Podemos dizer que na atualidade o cinema retrata de forma eficaz o período em que vivemos. Por conta disso com o advento da aceitação do cabelo em sua forma natural, já estava passando da hora de termos um filme especialmente focado no público que se identifica com essa abordagem temática. Todas as produções, pelo menos em que já vi, sempre foram feitas em forma de documentário e voltadas para esse setor de mercado “o cabelo”. Mas como a Netflix tem colocado seus olhares fixos em suas produções de filmes em 2018, deu o ponta pé inicial e lançou “Felicidade por um fio”. Uma comédia romântica dirigida por Haifaa Al-Mansour, a primeira cineasta mulher da Arábia Saudita.
A história foi adaptada do livro da escritora Trisha Thomas que traz uma trama voltada à transição capilar e empoderamento por parte da protagonista Violet Jones, que ganha uma poderosa interpretação da lindíssima, apaixonante e talentosa Sanna Lathan. Aqueles que assistirem o trailer do filme, sem sombra de dúvidas terão vontade de acompanhar essa história, principalmente quem se interessa pela referida temática, principalmente pelo final, lá pelos 98 minutos, temos um resultado ainda melhor do que o teaser deixa transparecer. Eu certamente fui surpreendido de uma forma tão positiva, que ao terminar de assistir, sem perder tempo, fui indicando o filme para meus contatos. Mesmo se tratando de uma produção considerada quase de “utilidade pública”, a produção faz com que todos entendam de forma divertida e convincente como a ditadura da beleza e da perfeição é cruel principalmente para as mulheres, quando os traços pessoais não seguem o padrão do que é considerado belo pela sociedade atual. No caso deste filme, existe toda uma cobrança e sofrimento só pelo fato do cabelo não ser igual ao da maioria das atrizes de TV e modelos de comerciais, ainda mais se a pressão vem desde muito cedo, algo exigido pelos pais desde a infância, período em que estamos moldando nossa personalidade.
Essa é justamente o drama de Violet Jones, publicitária bem-sucedida que tem nos cabelos longos e impecavelmente alisados o foco da sua segurança e feminilidade. No flashback de sua infância, exibido logo no início do longa, a menina aparece destacada das demais crianças que brincam na piscina para não estragar o cabelo, enquanto sua voz já adulta narra ao fundo que as garotas naturalmente lisas brincavam descabeladas e sem se preocupar com a aparência, algo que ela não podia fazer. Mas, mesmo com vontade, Violet parecia firme em resistir à tentação de pular na água, para o alívio de sua mãe, que queria ver a filha sempre perfeita. No entanto, quando um garotinho a desafia a dar um mergulho, a garota não resiste, acaba estragando sua escova e vira alvo de risadas e zoações das demais crianças por causa do volume da sua textura natural, situação facilmente identificável por quem também tinha o cabelo assim na fase em que o liso reinava como absoluto em todos os contextos.
Segundo diversos relatos ao longo da história, acontecimentos positivos ou negativos vividos nessa fase da vida, produzem traumas e marcam para sempre; então, não é difícil entender a obsessão da protagonista por seus cabelos quando, já em sua fase adulta, ela acorda mais cedo que o namorado para refazer a escova e se esquiva de certos contatos durante o sexo para que ele não tire nenhum fio do lugar. Essas cenas podem parecer muito distantes para quem não vive essa realidade, mas quem passou por essa fase de complexos com o cabelo, certamente vai se identificar com cada um desses momentos muito bem na minha humilde opinião muito bem construídos para o filme.
Diante de todo esse contexto, parece ser impossível imaginarmos Violet sem sua fiel chapinha, mas a mudança no comportamento em relação ao seu cabelo se dá depois de uma sequência de acontecimentos errados e muitas reviravoltas na história. O filme é repleto de momentos tocantes e diálogos que conseguem ser didáticos sem subestimar a inteligência do público, em “Felicidade Por Um Fio” a jornada de descoberta da personagem é incrível e tão individual, que o filme poderia falar apenas dela e não faria falta a introdução de subtramas.
A Netflix merece aplausos pela produção. Desde a escolha do elenco aos pontos que aborda para narrar a trajetória de aceitação de alguém que se desgastava para chegar próximo do que era considerado bonito, “Felicidade Por Um Fio” é o tipo de filme sobre representatividade que estava faltando no mundo cinematográfico. Tenho certeza que muitas meninas ao verem esse filme, vão saber que está tudo bem alisar se essa for a sua real vontade, mas que apostar no natural sempre pode ser uma opção considerável, talvez, quem sabe, o melhor caminho para se encontrar e ter orgulho de quem você é. Minha nota 8,5!

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