Artigo – Nós somos brancos, nós nos entenderemos
Por Oswaldo Bezerra
No século XVIII, era comum a divisão racial entre os regimentos do exército. Certo dia, um oficial do Regimento dos Pardos e Negros do Rio de Janeiro, Manuel Dias de Resende, foi queixar-se ao seu superior, por ter sido desrespeitado por um soldado.
Diante da reclamação, o major Mela, comandante do Regimento, menosprezou a situação dizendo: “Vocês que são pardos, que se entendam!”. A resposta soou como uma segunda ofensa para o capitão Manuel. Este então recorreu a dom Luís de Vasconcelos e Souza, vice-rei (governador) da província do Rio de Janeiro.
O governador logo mandou prender o major que não levara a reclamação a sério. Sem entender o motivo por estar sendo preso, o major Melo perguntou: “Preso, eu, mas por quê?”. A resposta saiu na mesma medida: “Nós somos brancos, cá nos entendemos”.
Com o passar dos anos, a frase tomou a forma atual que é: “Vocês que são brancos que se entendam”. Dessa contenda surgiu uma das primeiras punições por racismo no Brasil. Dom Luís de Vasconcelos, que é o responsável pela construção do Passeio Público da “Cidade Maravilhosa”, faz falta nos dias de hoje.
Crimes de racismos por autoridades não são mais punidas. Ontem, por unanimidade, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Paraná arquivou o processo disciplinar, aberto contra a juíza Inês Marchalek Zarpelon, da 1ª Vara Criminal de Curitiba, para apurar se ela cometeu crime de racismo, ao associar a raça negra a grupo criminoso.
Este flagrante de corporativismo entre magistrados não foi uma exceção a regra. Nos últimos 10 anos, nenhum juiz foi punido por racismo nos processos do CNJ. Do total de processos sete foram arquivados e 2 suspensos. São mais de 19 mil juízes no Brasil.
O número de processos por racismos é baixo, pois é subnotificado, o motivo, todos sabem que este tipo de processo não leva a nada. A sensação de impunidade é absoluta para juízes e desembargadores. Assim provoca uma “naturalização” do racismo no sistema jurídico.
Apenas 18% dos juízes se consideram negros, no Brasil. A Constituição Federal garante uma sociedade fraterna, mas é impossível sem igualdade na esfera jurídica.
Nosso desafio é lutar por políticas públicas que garantam a igualdade. O sistema jurídico precisa se moldar ao fato que, não é por serem brancos, que das responsabilidades se evadirão.
RG 15 / O Impacto