O PAPEL DO ESTADO E DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DIANTE DAS OCUPAÇÕES DE PROPRIEDADE NA ÁREA URBANA DE SANTARÉM
O processo de urbanização de Santarém é visível e crescente ao longo dos anos. Grandes áreas de terra, dentro do espaço da cidade ou nos seus arredores, de repente e rapidamente se tornam novos bairros que formigam dia e noite. Porém, a opção para as pessoas que não possuem recursos é a apropriação de terrenos, onde essas ocupações são formadas sem planejamento e por isso não contam com infraestrutura adequada. Sabemos que as cidades tendem a se tornar maiores, principalmente aquelas que recebem os migrantes da zona rural, por isso necessitam ocupar mais espaço. Contudo, esse tipo de crescimento desordenado acaba gerando algumas implicações sejam de ordem econômica, social, ambiental e até de saúde pública.
Aqui em Santarém não é diferente. Basta darmos uma volta pelos novos (e até velhos bairros) que surgiram de invasões para vermos esgoto a céu aberto, falta de pavimentação e redes de água e energia, ausência de creches, escolas, postos de saúde e outras bases de organização das quais uma comunidade necessita minimamente. Então, qual o papel do governo dentro desse cenário?
É dever do Estado garantir o acesso a uma habitação a todos os brasileiros, benefício assegurado através do Art. 6º da Constituição de 1988, que diz que “são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados”. Vemos então que no que diz respeito às ocupações urbanas desordenadas, a única maneira de coibi-las é através de políticas públicas que regulamentem terrenos caso seja possível, fiscalizem a expansão desses novos bairros para que se adéquem às necessidades dos moradores e, caso não haja possibilidade de dispor o terreno para essa população, que sejam realocados através de novas alternativas de moradia.
O problema se dá então justamente por conta dessa demora do Estado para resolver questões acerca de invasões de propriedade. Locais de preservação ambiental são destruídos sem que nada seja feito para impedir, ou, quando alguma decisão é tomada já é tarde demais para reverter a ação invasora. Os novos bairros ocupados também vão crescendo de forma caótica e o que temos são muitas moradias concentradas sem que haja espaço para o lazer, saúde e educação. Esse atraso na tomada de decisões vai à contramão do que manda a lei nº 11.977/2009, de 10 de julho de 2001, que “regulamenta os Arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências”, na qual o Art. 1º, parágrafo único, defende o estabelecimento de “normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental.”
Uma das tentativas de oferecer moradia àqueles que necessitam aqui em Santarém surgiu através da implantação do projeto “Minha casa, Minha vida”, do Governo Federal, implementado através da lei Nº 11.977, de 7 de julho de 2009, que “tem por finalidade criar mecanismos de incentivo à produção e aquisição de novas unidades habitacionais ou requalificação de imóveis urbanos e produção ou reforma de habitações rurais, para famílias com renda mensal de até R$ 4.650,00 (quatro mil, seiscentos e cinquenta reais).” A cidade foi agraciada com duas unidades residenciais: o Residencial Salvação, localizado na Rodovia Fernando Guilhon, e o Residencial Moaçara, localizado na avenida de mesmo nome. Até hoje somente o Residencial Salvação foi entregue à população, porém as 3.081 unidades oferecidas não foram suficientes para reduzir o déficit de moradias em Santarém. Sobre o Residencial Moaçara, este se encontra com as obras paradas e os cidadãos ainda esperam pelo momento de sua entrega.
O caso mais recente de conflitos por terra urbana é o da ocupação Bela Vista do Juá. Situado próximo a uma área de preservação ambiental, já foram expedidas decisões judiciais de reintegração de posse, através do processo nº 0003993-38.2017.8.14.0051. O ato mais recente foi realizado no dia 05 de novembro de 2018, no qual o Juiz de direito Claytoney Passos Ferreira determinou “que os ocupantes da APP do Juá fossem retirados da área pelo Poder Público, bem como que fossem demolidas construções, estacas, marcações e etc. no prazo de 5 (cinco) dias.” Nada é dito sobre o que serão feitas dessas pessoas e sobre o espaço já danificado.
Contudo, seguimos em 2020 sem que a área tenha sido desocupada. E no momento, apesar de época eleitoral, quase nada vemos sobre propostas no que concerne à moradia e as situações de conflito que a falta dela geram na cidade. O que podemos dizer, portanto, é que para resolver essas questões analisadas, o Estado deveria agir oferecendo políticas públicas e soluções rápidas. Sabemos que muitas dessas pessoas acabam por invadir o que não lhes pertence somente porque não há outra opção e, desinformadas, constroem desordenadamente. Com uma população estimada em 306.480 habitantes, segundo dados do IBGE, Santarém apresenta somente “38.1% de domicílios com esgotamento sanitário adequado, 43.3% de domicílios urbanos em vias públicas com arborização e 7.8% de domicílios urbanos em vias públicas com urbanização adequada (presença de bueiro, calçada, pavimentação e meio-fio).” E, se não houver intervenção dos órgãos competentes, infelizmente nossas áreas serão desmatadas e nossa população continuará crescendo sem que a cidade consiga acompanhar e oferecer a esse volume de pessoas as condições indispensáveis para uma vida digna.
Por: Thays Cunha
RG 15 / O Impacto
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