Artigo – O que há muito além da cortina de fumaça

Por Oswaldo Bezerra

Histórias incríveis, fatos bizarros como animais mutantes de Chernobyl, orgias de Maria Antonieta, QAnon, Russiagate, kit gays, terra plana, mamadeira de piroca, um país formado por maricas, as teorias da conspiração florescem em tempos de crise e colapso da legitimidade política. Mais do que nunca, hoje vivemos uma era em que o “diversionismo” está sendo usado e abusado em todo o mundo.

Diversionismo é por definição um estratagema para impedir que se discuta, ou se aprove algo (uma lei, uma resolução, etc.), ocupando todo o tempo ou desviando-se a atenção dos participantes para assunto diferente do que está sendo tratado.

Trinta e quatro anos atrás os cidadãos soviéticos não conseguiam respostas, pelos meios oficiais, sobre o desastre de Chernobyl, manchando irreparavelmente sua fé no sistema que o causou. Nada fazia sentido. O que causou tudo isso? Havia relatos de luz sobrenatural, espiões e sabotadores estrangeiros. Não adiantava procurar respostas nos jornais, na televisão ou no rádio; eles nunca contariam a verdade às pessoas.

Chernobyl foi sem dúvida a primeira grande fratura da União Soviética. O alcance das mentiras oficiais e incompetência chocaram o país. Com medo de alimentar o pânico, o governo minimizou publicamente o desastre e demorou a evacuar a cidade mais próxima, Pripyat. O comício anual do Primeiro de Maio em Kiev insistiu em que seu povo trouxesse seus filhos para projetar normalidade. Os moradores souberam mais tarde que os burocratas do partido já haviam tirado seus filhos do perigo.

O povo perdeu a fé em seu sistema e instituições. Fato semelhante que acontece hoje nos EUA. Um grande número de norte-americanos sucumbiu aos pensamentos conspiratórios, no meio de outra crise apocalíptica.

Este ano ocorreu uma explosão na popularidade do QAnon, a teoria bizarra de que Donald Trump e outros oficiais de direita estão secretamente lutando contra uma conspiração de pedófilos liberais e canibais. O jornal Time Charlotte Alter descobriu que pelo menos um em cada cinco pessoas expressava uma crença conspiratória da QAnon, como elites pedófilas controlando o sistema político dos EUA até COVID-19 sendo uma farsa.

A ascensão dessa safra atual de teorias da conspiração é tipicamente vista como uma loucura coletiva peculiar à Direita. Afinal de contas, QAnon está explicitamente alinhado com Trump, e há uma longa história de pensamento conspiratório no conservadorismo dos Estados Unidos, do macarthismo e os Birchers ao birterismo e o medo da Sharia.

Surgiram boatos de atores estrangeiros ”pelos protestos e tumultos que se seguiram ao assassinato de George Floyd pela polícia em maio. Houve também a crença de que Donald Trump era controlado pelo presidente russo Vladimir Putin. Os especialistas apontam que tudo isso leva para uma perda de confiança nas instituições, uma sensação de crise e uma desilusão generalizada com os sistemas políticos. A quem interessa isto? Interessa a quem quer praticar o diversionismo.

O diversionimso está sendo usado aqui no Brasil também e de maneira vasta. O uso está tão generalizado que até causou indignação a um jornalista da TV Cultura, Aldo Quiroga. Ele desabafou sobre os últimos diversionismos do presidente: “Nesta edição é a última vez que você vai ouvir as palavras “pólvora” e “maricas”. Uma hipotética guerra contra os EUA contraria toda a lógica. Não damos espaço para a homofobia, mas 162 mil mortos não admitem qualquer adjetivo de palanque; só atitude de enfrentamento de salvar vidas. Infelizmente todo este diversionismo está escondendo a grave crise econômica, social, ambiental, sanitária e de segurança alimentar em que o Brasil está sendo afogando.

RG 15 / O Impacto

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