Artigo – Os impactos da pandemia no tratamento de outras doenças

Por Thays Cunha

Uma das preocupações que veio juntamente com a pandemia da covid-19 foi em relação à como os sistemas de saúde iriam dar conta de tratar todos aqueles que ficassem infectados. Assim, a pandemia mudou a realidade das pessoas e o seu comportamento, incluindo à questão dos cuidados consigo mesmo. Por medo de serem infectados pelo coronavírus, no início da pandemia muitos evitaram sair de casa mesmo que fosse para se consultar, realizar exames ou avaliar um problema de saúde, deixando para depois qualquer tratamento a ser realizado. E agora, com o avanço da doença, superlotação de hospitais e falta de insumos e medicamentos, a situação daqueles que adoecem se tornou ainda mais preocupante.

Os hospitais foram reordenados e a grande maioria dos atendimentos direcionados para conter a pandemia, que já está quase chegando a 500.000 óbitos aqui no Brasil. Antes pensada como uma enfermidade que atingia somente os idosos ou pessoas com comorbidades, a cada dia que passa fica maior o número de jovens saudáveis que estão perdendo a vida por conta do vírus ou que, mesmo curados, precisaram de tratamento extensivo através de intubação, ventilação mecânica e internação em leito de UTI.

Para comportar o novo fluxo de atendimento, os hospitais e equipes tiveram que se reordenar. Por conta da gravidade do novo coronavírus, grande parte dos recursos financeiros, além dos profissionais de saúde, acabaram sendo direcionados para o seu enfrentamento. Desse modo algumas cirurgias eletivas foram adiadas e alguns pacientes de doenças graves ou crônicas se encontraram tendo que postergar seus tratamentos. Porém, quanto mais cedo uma doença é diagnosticada e tratada melhores são as chances da pessoa se recuperar. Ou seja, esse atraso em diversos diagnósticos e intervenções gerado pela pandemia pode levar os que ainda não sabem que adoeceram a identificarem tardiamente que possuem alguma enfermidade, o que os fará correr um maior risco de desenvolver complicações graves; e levar os que já estão doentes a terem seus quadros agravados. Sabemos também que esse atraso posteriormente irá gerar gastos maiores para o sistema de saúde, uma vez que quanto pior está a saúde de uma pessoa, mais recursos serão necessários para tratá-la.

Segundo uma pesquisa realizada em 2020 pela Johnson & Johnson Medical Devices, que entrevistou de setembro a outubro 2.200 pessoas em cinco países da América Latina – Argentina, Brasil, Chile, Colômbia e México – e que faz parte do projeto “My health can’t wait” (Minha saúde não pode esperar), 70% dos participantes adiaram ou cancelaram serviços de atenção médica por causa da pandemia, ou seja, uma grande parcela das pessoas ficou sem descobrir se tem doenças ou tratar as já existentes. Aqui no Brasil, 39% dos brasileiros afirmam que a sua saúde piorou durante o período de pandemia, sendo que para 25% ela piorou pouco e para 14% a sua saúde piorou muito.

Para a pesquisa, “adiar ou cancelar uma consulta ou procedimento médico de rotina ou ignorar sintomas de saúde de emergência pode ter um impacto negativo sobre a sua saúde”. Esses efeitos estão começando a serem sentidos, pois, “em alguns locais, hospitais e clínicas notaram um pico de pacientes que adiaram seus cuidados de saúde por um período tão longo que tiveram suas doenças agravadas”.

DOENÇAS CRÔNICAS E OUTRAS PATOLOGIAS

O Comitê do Conselho Nacional de Saúde (CNS) de acompanhamento à covid-19 debateu em uma Live, realizada no ano passado, a questão do diagnóstico tardio, subnotificação de casos, dificuldade de acesso a medicamentos e desassistência encontrados por pacientes de doenças crônicas e outras patologias desde o advento do primeiro caso do novo coronavírus no país. Segundo o comitê, pessoas que sofrem com o HIV/Aids, tuberculose, lúpus, hanseníase, psoríase, osteoporose, artrite e dermatomiosite estão entre os que revelam que a pandemia impactou de forma negativa o tratamento de suas doenças, principalmente na questão dos medicamentos. Pesquisa realizada pela BioRede Brasil Medicamentos Biotecnológicos, apresentada pelo comitê durante a Live, afirma que “95% dos pacientes reumáticos utilizam a hidroxicloroquina para seus tratamentos. Antes da pandemia, 65% das pessoas nunca tiveram dificuldade para comprar o medicamento. Hoje, 84% não encontra o remédio com facilidade. Estes pacientes relatam também o impacto financeiro sobre a renda familiar: enquanto o gasto médio antes da pandemia era de R$ 100 hoje os custos mensais com a hidroxicloroquina chegam a aproximadamente R$ 450”.

O diagnóstico tardio também foi uma das situações analisadas, pois informações apontam que até período, julho de 2020, havia no sistema de informações do Ministério da Saúde cerca de 6 mil diagnósticos de hanseníase, sendo que, para a época, deveria haver muito mais. Há a preocupação também com o agravo e aumento de diagnóstico tardio e subnotificação em relação ao HIV/Aids e também tuberculose.

Em relação ao câncer, de acordo com a sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO), somente entre março e maio de 2020, ainda início da pandemia no Brasil, 7 entre cada 10 cirurgias de câncer não foram realizadas, assim como cerca de 50 mil brasileiros não puderam ser diagnosticados com câncer e logo iniciarem o tratamento. Isso vem gerando uma grande preocupação, pois muitos desses casos são assintomáticos, contudo evoluem de forma acelerada, podendo levar à morte se não diagnosticados e tratados a tempo.

Já outros atendimentos, mesmo que mais básicos, também sofreram reduções. Um levantamento realizado a pedido da ONU constatou que sete em cada dez nações sofreram impactos severos nos atendimentos de planejamento familiar e contraceptivos. A metade das consultas de pré-natal teriam sido cancelas, além de ter havido a interrupção de mais de 30% dos serviços de parto.

PREVENÇÃO

Uma das soluções que vem ganhando destaque no momento, diante da necessidade do distanciamento social, é a chamada “telemedicina”, pois esse tipo de atendimento permite o acesso a um médico sem sair de casa. É importante ressaltar que a telemedicina não virá a substituir o atendimento presencial, contudo é bastante útil em casos de simples resolução e triagem de pacientes.

Assim, para prevenir a contaminação pela covid-19, assim como manter a saúde em tempos de pandemia, é necessário implementar, continuar e aumentar certos cuidados. Por exemplo, alguns hospitais já separaram áreas exclusivas para atender pacientes infectados pelo coronavírus, agilizaram os atendimentos para que haja mais rapidez nos diagnósticos e mantém os protocolos de higiene recomendados.

Individualmente, cada pessoa também tem que se cuidar. Sair de casa somente se for necessário, usar máscara adequada para cobrir a boca a o nariz, lavar frequentemente as mãos com água e sabão ou usar álcool para higienizá-las, e manter o distanciamento social. Porém, é necessário buscar atendimento médico sempre que for imprescindível, como ao sentir sintomas fortes ou incomuns, dores, falta de ar, fraqueza e outros. Toda alteração física deve ser avaliada por um especialista, então o risco de ser contaminado pela covid pode ser suplantado pela gravidade de estar com uma outra doença igualmente ou mais perigosa. Pessoas em tratamento de doenças, principalmente as crônicas, também não devem interromper o tratamento, se possível. É fundamental manter o acompanhamento médico, sem deixar de buscar orientações. E quanto aos governos, precisam fazer o que for possível para fortalecerem os sistemas de saúde do país e com isso salvar milhares de vidas, seja as acometidas pelo vírus ou por outros problemas.

 RG 15 / O Impacto

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