Promotoria aciona justiça para que município cumpra decisão relacionada ao Hospital Municipal de Santarém

Por Diene Moura

A Promotoria de Justiça de Santarém solicitou no dia 1° de julho, perante a 6ª Vara Cível, o cumprimento definitivo de sentença pronunciada em Ação Civil Pública (ACP), para que o município cumpra obrigação judicialmente imposta para adoção de medidas relacionadas ao Hospital Municipal Alberto Tolentino.

A solicitação também exigiu que sejam determinadas  as medidas com  aplicação de multa aos responsáveis pela execução das determinações que assegurem o cumprimento da sentença, como medida indispensável ao desempenho da política pública de garantia do direito fundamental à Saúde e do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

A Ação Civil Pública (ACP) foi ajuizada no ano de 2011 com sentença proferida no ano de 2017, favorável ao Ministério Público. O Município de Santarém interpôs recurso de apelação, mas foi negado pelo Egrégio Tribunal de Justiça, o qual confirmou a decisão de primeiro grau, com trânsito em julgado em 20 de abril de 2021, confirmando a obrigação imposta ao município.

O trâmite processual visa compelir o poder público a tomar medidas necessárias para adequação do Pronto Socorro Municipal (PSM) de Santarém. Dentre as  medidas impostas estão:

  • Implantar e manter o funcionamento do Plantão 24h nas dependências do Pronto Socorro Municipal de Santarém (PSM), com a presença física de, pelo menos, um médico para cada um das seguintes especialidades: anestesiologista, clínica médica, pediatria, cirurgia geral, ortopedia e obstetrícia, sem prejuízo de superar esses números em caso de comprovada necessidade;
  • Disponibilizar em caráter contínuo e permanente insumos, materiais e medicação básica necessários a prestação do serviço de saúde no Hospital Municipal de Santarém, em conformidade com as disposições da Portaria Nº 2.048/2002 e Resolução nº 07/2010 da Comissão Inter Gestores Bipartite (CIB) do Pará e suas atualizações, e demais atos normativos do sistema de saúde em vigor;
  • Implantar e manter rotina de higienização e limpeza nos ambientes do Hospital Municipal de Santarém, em conformidade com as normas práticas sanitárias, provendo, por esse fim, todos ao insumos necessários;
  • Ativar e manter a rede canalizada de oxigênio, ar comprimido e vácuo do Pronto Socorro de Santarém;
  • Adequar integralmente o Pronto-Socorro Municipal às disposições da portaria nº 2.048/2002 do Ministério da Saúde, no prazo máximo e improrrogável de sessenta dias.

A petição de cumprimento do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA)  traz os relatórios técnicos que apontam o descumprimento da sentença judicial, como a ausência de especialidades médicas no plantão 24 horas, falta de medicamentos e insumos, limpeza e higienização inadequadas, inexistência de rede canalizada de oxigênio, ar comprimido e vácuo nas alas de observação masculina, feminina, pediatria e trauma, além de outras irregularidades que vão de encontro às normas do Ministério da Saúde.

O MPPA destaca que o Município de Santarém tomou ciência do acórdão e informou a renúncia ao prazo para recurso, com o argumento que o Hospital Municipal de Santarém está sendo gerido pela Organização Social “Mais Saúde”, em razão do Contrato de Gestão n° 105/2020, e que as portarias do Ministério da Saúde estão sendo cumpridas, pois o Pronto-Socorro Municipal está em pleno funcionamento.

Inspeções comprovam descumprimento deliberado pelo município

A promotoria realizou diversas inspeções nas dependências do PSM/Hospital Municipal de Santarém, através das quais se verificou o descumprimento deliberado pelo município, que se perpetua ano após ano, tomando proporções ainda maiores com o advento da pandemia. Em dezembro de 2020 foi constatada superlotação do espaço, severas omissões estruturais, de recursos humanos, falta de insumos e medicamentos. Em outra inspeção, no dia 26 de fevereiro de 2021, os problemas persistiram. E em 12 de junho deste ano, em razão das diversas reclamações quanto ao atendimento prestado no HMS, foi realizada nova inspeção, sendo verificado que os mesmos problemas permanecem.

O  Ministério Público do Estado do Pará   (MPPA), acompanhado do Conselho Municipal de Saúde realizou a última inspeção nas dependências do hospital  no dia 18 de junho de 2021, durante a noite. Durante visita, foi constatado mais uma vez que o município permanece descumprindo as obrigações determinadas judicialmente.

Segundo o MPPA, o município de Santarém tomou conhecimento de todas as constatações feitas em inspeções, mediante recebimento dos respectivos relatórios, e mesmo com a concessão de prazos e abertura para resolução de forma extrajudicial, não adotou providências para as adequações.

“Apesar da terceirização da gestão, a prestação dos serviços é de responsabilidade primária do Ente Público, no caso o Município de Santarém. A gestão hospitalar por terceirizadas apresenta caráter precário e temporário, pois os Contratos de Gestão têm tempo determinado, e é necessário resguardar o princípio da continuidade, sobretudo em demanda relativa à saúde’’, concluiu a promotoria.

Inspeção em leitos psiquiátricos

As inspeções da promotoria de justiça ao hospital que atende a população de Santarém e região são consideradas recorrentes.  No dia 28 de maio, promotores visitaram, a convite da Divisão Técnica da 9ª Regional da Sespa, os leitos de saúde mental para constatar quais as condições físicas e como é realizado o atendimento no setor de saúde. Também outra inspeção havia sido realizada no dia 8 de abril, na presença de equipe do setor psicossocial das Promotorias de Justiça de Santarém.

Na visita datada aquele dia foi constatado que a unidade possui atualmente dois leitos psiquiátricos. Levando em consideração que a  população do município está estimada em 306.408 mil, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), são necessários, no mínimo, dez leitos para atender a demanda de pacientes residentes só em Santarém.

Segundo o  MPPA, após analisar documento encaminhado pela Coordenação Estadual de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas da SESPA,  a implantação de leitos em saúde mental está previsto no Plano Estadual da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) da resolução nº 259/2013, e a Região de Saúde do Baixo Amazonas está entre as regiões prioritárias, considerando o déficit de um leito por 23.000 habitantes.

Foi informado à promotoria que os atendimentos são realizados no CAPS, e eventual situação de internação é feita nos Hospitais Municipais, e que equipe do Hospital Municipal de Santarém atualmente é formada por um médico clínico, que faz o atendimento e estabilização do surto, um enfermeiro, um psicólogo e um técnico de enfermagem, que acompanham o paciente no período de 24 horas, para saúde mental e hospital geral, não havendo, portanto, equipe específica para internação de saúde mental. Na época, a direção do hospital afirmou que  não havia demanda para internação e que havia dois leitos psiquiátricos disponíveis.

Atendimento de surtos psicóticos

O fato ocorrido na última sexta-feira (2), com um homem que durante um surto psicótico atacou com pedras e paus um veículo do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) e mobilizou a ação de Policiais Militares e Grupo Tático Operacional (GTO), para a sua contenção nas proximidades da Avenida Moaçara, trás a debate o serviço que busca atender às necessidade básicas deste público que em sua maioria estão inseridos em grupos considerados usuários de drogas e moradores de rua.

A ação para inibir o paciente contou com a participação de policiais, pois a abordagem segue um protocolo firmado entre a Secretaria de Saúde do Pará (SESPA), SAMU, 2 ° CIME, CAPS AD e CAPS 2.  Como afirma o Coordenador do Samu,  Joziel Colares. ‘’Foi montado um protocolo de parceria entre SAMU e Grupo Tático Operacional para que em ocorrências de pacientes com surtos psicóticos sejam acompanhados de militares, pois são utilizados  armas não letais, bem como balas de borracha, spray de pimenta a fim de inibir  esses indivíduos’’, disse o coordenador.

O coordenador destacou ainda como é realizado o atendimento a esses pacientes. ‘’Primeiramente existe várias formas da gente atender, tem o surto psicótico que observamos que dá para ele ficar na casa, no convívio familiar. Nós fazemos a contenção química e as medicações de sedativos, em seguida nosso médico faz a prescrição, nós administramos e  com a contenção química ele fica lá, quando acordar vai estar mais tranquilo . Já o que está oferecendo risco para a comunidade ali ao redor,  para sua vizinhança ou até para a própria família, a gente retira ele do local, faz a contenção química, ou seja, injeta o sedativo na ambulância e o entrega sedado ao hospital, onde a partir daí assumirão a responsabilidade de atendê-lo, e se for o caso ficarão mantendo a sedação dele caso seja um paciente muito agressivo”, ressaltou.

Se o GTO não acompanhar os profissionais de saúde do SAMU diante de casos de surtos psicóticos, a ocorrência não será atendida devido à integridade física dos profissionais estarem vulneráveis nessas situações.  Mesmo com a intervenção policial com a  utilização de  armas não letais, o homem com transtornos mentais atacou a Unidade de Suporte Avançado diversas vezes,  atingindo três vezes a lateral e mais duas vezes o para-brisa. Este fato resultou em um veículo deteriorado e serviços paralisados por cerca de 10 a 15 dias.

‘’Infelizmente ele se evadiu do hospital novamente, porque nós já tínhamos pegado ele na manhã de sexta-feira. Quando foi à tarde fomos novamente lá, pegamos ele, deu todo aquele transtorno, deixamos no hospital e quando foi na madrugada ele fugiu. Isso sem ninguém  ver, interessante que ninguém viu, [ele] saiu despercebido porque ali no pronto socorro é uma correria muito grande. Diante disso acabou que o ‘surtado’ saiu de lá sem ninguém perceber. Isso tá acontecendo porque ele se encontra na rua, e já estamos aguardando alguém nos chamar novamente e vamos fazer a internação e também procurar ajuda, porque esse senhor, precisa ser feita uma intervenção nele urgente e que segure ele de qualquer forma, na sequência entre no tratamento, e mande ele para a capital Belém’’, concluiu Joziel Colares.

Este caso está sendo acompanhado pelo Ministério Público, SESPA e pelo Hospital Municipal, que estão atentos ao paciente que oferece risco à comunidade em geral. Embora o homem tenha denegrido um patrimônio público, não irá responder por seus atos devido sua condição física e mental.   Outro caso atendido pelas equipes do SAMU, aconteceu na terça-feira (6), nas proximidades do Porto do Milagres, no bairro Uruará.  Uma pessoa em estado de surto deu um tapa na sua mãe.

Tais fatos com indícios de agressividade e falta de controle da própria família e do poder público causam ainda mais preocupação e acendem um alerta urgente.  Em Santarém, não há um espaço adequado para que essas pessoas que sofrem desses problemas sejam melhor assistidos com a disponibilidade de serviços essenciais, bem como acesso a médicos, exames, remédios, além de promover mecanismos que permitem desenvolver a qualidade de vida dessas pessoas. Pode até existir planos e estratégias, mas na prática se torna  inviável.

RG 15 / O Impacto

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