Ex-prefeito de Belém é condenado a devolver R$ 4 milhões aos cofres públicos
A Justiça Federal condenou o ex-prefeito de Belém (PA) Duciomar Gomes da Costa em mais dois processos abertos a partir de ações do Ministério Público Federal (MPF). Juntamente com outras pessoas e empresas que participaram de esquemas de fraudes em contratações, o ex-prefeito foi sentenciado a devolver R$ 4 milhões aos cofres públicos, com juros e correção monetária, e a pagar multa de R$ 2,9 milhões. Ele também teve seus direitos políticos suspensos por oito anos e ficou proibido de fazer contratos com o Poder Público por dez anos.
Os prejuízos aos cofres públicos apontados pelo MPF à Justiça são referentes a ilegalidades no contrato para gerenciamento e supervisão das obras da urbanização da bacia do Paracuri e a desvios de recursos do Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem). As sentenças foram proferidas em julho pela juíza federal Hind Ghassan Kayath e foram divulgadas pelo MPF nesta quarta-feira (4).
As duas ações são decorrentes das investigações que resultaram na operação Forte do Castelo 1, realizada em dezembro de 2017. A investigação foi feita pelo MPF, com apoio da Controladoria-Geral da União (CGU) e da Receita Federal, e a execução da operação teve o apoio da Polícia Federal, após a Justiça Federal ter deferido os mandados pedidos pelo MPF.
Bacia do Paracuri – Assinada pelos procuradores da República Alan Rogério Mansur Silva e Ubiratan Cazetta, a ação por improbidade administrativa na licitação para gerenciamento e supervisão das obras da urbanização da bacia do Paracuri apontou que a CGU identificou restrição ao caráter competitivo da licitação e irregularidades na análise do julgamento das propostas apresentadas no procedimento licitatório, com o objetivo deliberado de direcionar a contratação para a construtora Sistema Brasileiro de Construção (SBC), empresa que tem entre os sócios a companheira do ex-prefeito, Elaine Baía Pereira, e outras pessoas de confiança de Duciomar Costa.
Para a juíza federal Hind Kayath, “(…) os atos ímprobos perpassam da mera configuração do dano ao erário e violação a princípios da Administração Pública, tendo o condão de caracterizar a modalidade mais grave de improbidade administrativa, a que causa enriquecimento ilícito, na medida em que a fraude no processo licitatório e o direcionamento dos serviços contratados foram apenas instrumentos para uma verdadeira autodestinação de recursos públicos, haja vista que a licitante vencedora possuía em sua composição societária pessoas que mantinham ou mantiveram vínculo pessoal e funcional com o então gestor municipal”.
Na sentença também é registrado que a companheira do ex-prefeito e a empresa tiveram crescimento patrimonial significativo no mesmo período em que Duciomar Costa atuou como prefeito e em que a empresa assinou diversos contratos com a prefeitura. Segundo a Receita Federal, a empresa foi beneficiada com quase R$ 300 milhões, e o patrimônio de Elaine Pereira aumentou 200 vezes: de R$ 60 mil, em 2004, para R$ 12 milhões, em 2015. Outro sócio da construtora, Célio Araújo de Souza, foi contratado em 2008 pela prefeitura para trabalhar como gari. Entre 2006 e 2015 teve o patrimônio aumentado em 67 vezes: de R$ 24 mil para R$ 1,6 milhão. E o patrimônio de Ilza Baía Pereira, irmã da companheira de Duciomar e também sócia da empresa, foi de R$ 82 mil em 2008 para aproximadamente R$ 2 milhões em 2015, multiplicação de 25 vezes no período, indica a decisão judicial.
A juíza federal Hind Ghassan Kayath também ressaltou a ocorrência de uma série de impedimentos ilegais à competitividade da licitação, como o impedimento à participação de consórcios sem que houvesse justificativa técnica para essa decisão, a exigência da apresentação de garantias contábeis não previstas na legislação, a exigência cumulativa de garantia de proposta e capital social mínimo, a ausência de estudo técnico no processo administrativo que respaldasse a exigência de índices contábeis e de endividamento, a exigência de apresentação de quitação de tributos e contribuições federais em vez apenas da certidão que o Tribunal de Contas da União (TCU) entende como obrigatória, a exigência de que a retirada do edital, impugnações e solicitações de esclarecimentos fossem feitas de forma presencial na sede da comissão de licitação, a obrigatoriedade de realização de visita técnica em data única e restrita ao responsável técnico da licitante, a limitação do prazo útil para participação das licitantes. Além disso, a sentença assinalou a ocorrência de simulação de visita técnica e de irregularidades na fase de julgamento da licitação.
Projovem – De autoria do procurador da República Alan Rogério Mansur Silva, a ação civil pública de ressarcimento ao erário relativa aos recursos do Projovem registrou que em 2009, no segundo mandato de Duciomar Costa como prefeito, a prefeitura fraudou licitação que tinha o objetivo de contratar empresa para promover qualificação socioprofissional de jovens. A licitação foi direcionada para a Fundação Centro de Extensão, Treinamento e Aperfeiçoamento Profissional (Cetap), que repassou recursos para um instituto controlado pelo ex-prefeito, o Instituto Portal do Conhecimento (IPC).
Apesar de não possuir funcionários cadastrados, o IPC movimentou grandes quantias financeiras, emitiu notas fiscais de serviço genéricas, prestou serviços e emitiu notas fiscais sempre para empresas contratadas pela Prefeitura de Belém, e foi utilizado para pagar contas de familiares de Duciomar Gomes da Costa, relatou a ação do MPF. “Chama atenção o fato de ter sido encontrado no escritório de Duciomar Costa na residência em São Paulo diversos documentos relativos a finanças e administração de empresas das quais o requerido jamais foi sócio, porém, que têm ou tiveram em seus quadros societários pessoas integrantes do grupo liderado pelo ex-prefeito, e que receberam recursos do município de Belém, direta ou indiretamente, na sua gestão”, salientou a juíza federal na sentença.
De acordo com a magistrada, essas foram mais provas de que o esquema ilegal articulado pelo ex-prefeito em relação aos recursos do Projovem não é fato isolado, pois os documentos apreendidos na residência do casal evidenciam que se trata de procedimento ilícito adotado em diversos outros procedimentos licitatórios realizados no período em que Duciomar Costa era prefeito de Belém, dos quais participavam empresas controladas de fato pelo casal, por meio de pessoas interpostas de confiança, incluindo o IPC, para apropriar-se de recursos públicos, por meio de direcionamento de licitações a empresas também participantes do esquema ilícito.
A sentença também acrescenta que, embora o IPC supostamente tenha prestado vários serviços a diferentes empresas contratadas pelo município de Belém, jamais apresentou empregados cadastrados na Relação Anual de Informações Sociais (Rais), e nas declarações de imposto de renda do período de 2008 a 2016 informou zero gasto referente a custos e despesas com pessoal. Também não foram identificados gastos com contribuições previdenciárias e Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), já que as Guia de Recolhimento do FGTS e de Informações à Previdência Social (Gfips) do mesmo período foram apresentadas sem movimento.
Ainda que o serviço tenha sido prestado de maneira eventual, é certo que mesmo na eventualidade a pessoa jurídica teria que contratar empregados para prestar os serviços descritos nas notas fiscais, e que estruturar a logística, sobretudo considerando que foram diversos serviços em diferentes momentos no tempo, para diversas empresas e envolvendo altos valores, aponta a juíza federal. Da mesma forma, a descrição de algumas notas fiscais, ainda que genérica, faz menção a suposto contrato de prestação de serviço, complementa.
O IPC, contudo, ao contestar, não apresentou sequer um contrato de prestação de serviço, para comprovar a alegação de que os serviços descritos nas notas fiscais foram prestados. “Ora, não é crível que uma pessoa jurídica fundada em 2003 e que se diz prestadora de serviços de capacitação e fornecedora de soluções na área educacional e informática, e que tenha expedido diversas notas fiscais a empresas distintas por supostos serviços por ela prestados, totalizando a quantia de R$ 5.665.258,00, não tenha em seu poder documentos comprobatórios dos supostos serviços prestados, tais como contratos, recibos, frequências, etc”, frisa o texto da sentença. (Com informações do MPF)
RG 15 / O Impacto