Raio-x da mente dos pedófilos presos em Santarém: O perfil que ameaça as crianças

Por Diene Moura

O ato considerado hediondo aos olhos da sociedade deixa rastros de dúvidas e questionamentos sobre a identificação do abusador e razões lógicas que o levam a sentir desejos sexuais por crianças. Todos os dias, meios de comunicação veiculam notícias, apontando mães, pais, tios, avós, padrastos, professores,  amigos, entre outros, como autores dessa ameaça eminente. Em entrevista à TV Impacto, a psicóloga Narjara Dantas apresentou o raio-x da mente dos pedófilos, antes, durante e após cometerem a violência sexual.

A pesquisa intitulada: “Cognições de agressores sexuais encarcerados: ênfase em abusadores e molestadores de crianças” determina como são, o que pensam, de que forma agem e porque sentem atração por menores? Todas as respostas dessas perguntas foram obtidas através de dados sociodemográfico e um formulário com roteiro de entrevistas contendo 11 perguntas, ambos foram aplicados para 23 encarcerados julgados pelo crime de estupro de vulnerável no Sistema Penitenciário de Santarém.

“O perfil invisível”

De acordo com a psicóloga Narjara Dantas, o estudo de campo, exploratória, descritiva e de abordagem qualitativa aconteceu em três encontros e houve a participação de mais duas acadêmicas. O estudo definiu o comportamento, pensamentos, percepções e até o sentimento do agressor.

A primeira característica deste indivíduo, considerada até  como “invisível”,  é que sua ação criminosa passa despercebida pela própria família ou no ambiente que aquele agressor está inserido. “Eles têm um perfil extremamente fora de qualquer suspeita. É um sujeito extremamente agradável, uma pessoa que se preocupa com o outro, ele gosta de agradar essas crianças. É acima de qualquer suspeita, de qualquer pessoa que esteja próximo. Porque quando acontece um caso desse geralmente na família,  é algo que acontece sem você nem imaginar. Nossa, aconteceu comigo?  Mas com quem? O fulano? O meu vizinho ou até mesmo o próprio pai, o tio, o próprio avô é o abusador!”, disse a psicóloga.

E destacou os motivos pelo qual deixam tantas dúvidas após  o caso ser denunciado.  “Porque esse abusador, ele faz com que as pessoas que estão ao redor dele, não suspeite de nada, porque ele é sedutor, ele é agradável, ele leva a criança para passear, ele dá dinheiro, ele dá doces, então assim é uma pessoa que tá fora de qualquer cogitação, de ser uma pessoa de risco para aquela criança, para aquele adolescente”.

Segundo a psicóloga, os agressores possuem um gosto específico por “suas presas”, que os tornam atrativas sexualmente. Embora absurdo, um dos encarcerados afirmou detalhes físicos, atitudes e até vestimentas das crianças que são preferíveis na hora do ato.

“Eu lembro que teve um relato de um desses, específico, que ele falou para mim que tem um perfil de criança. Isso acontece muito até com essa criança que é mais reprimida. Ela é mais caladinha, ela pouco deixa transparecer que algo de errado está acontecendo com ela. E essa criança precisaria está com uma determinada cor de roupa, por exemplo:  eu gosto quando eu vejo ela de blusa amarela e saia jeans, dessa forma ela me seduz, dessa forma, eu tenho desejo por ela. Então são alguns dos relatos que nós obtivemos dentro da pesquisa que esse abusador, tem os perfis de crianças e de adolescentes”, contou Nadjara.

O resultado e discussão da pesquisa foram organizados em dados sociodemográficos dos participantes, bem como: idade, escolaridade, atuação profissional, etnia, renda, crença religiosa, estado civil e quanto ao número de filhos. As pesquisadoras notaram que a maioria dos participantes (45%) abrangem a faixa etária entre 41 a 50 anos, sendo 85% deles de etnia negro/pardo e 60% casados/amasiados. Com relação a escolaridade, 65% dos entrevistados possuem o ensino fundamental e 55% com renda de um salário mínimo.

A atuação profissional dos abusadores variam em diversos setores, porém as mais frequentes, atingindo os 10% estão, balconistas/vendedores, lavradores, pedreiros, ajudantes, pescadores e serviços gerais. Na categoria crença religiosa, prevalecem 45% cristãos católicos e 40% os protestantes. Por fim, 50% dos detentos têm de um a dois filhos.

Características dos custodiados

Questionada sobre o que pode afetar tais indivíduos para que cheguem ao ponto de se tomarem atitudes monstruosas contra indefesos. A psicóloga explica que o comportamento está relacionado a um transtorno mental, ligado à pedofilia, denominado pela ciência como parafilia.

“A parafilia está dentro de um comportamento não adequado. Nós caracterizamos esse comportamento como não adequado de um desejo sexual por uma criança, que não é uma pessoa adulta.Então ele acaba desejando uma criança e ele acaba olhando também essa criança como se fosse uma mulher e que na realidade não é. Por isso é uma parafilia é um transtorno”, argumentou.

O Manual Diagnóstico Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), afirma que pedofilia ou transtorno pedofílico é uma parafilia aplicável aos indivíduos com mínimo de 16 anos de idade que revelam abertamente ou neguem seu interesse por fantasias ou coloquem em prática atos sexualmente excitante, impulsos sexuais ou comportamentos intenso e recorrentes envolvendo atividade sexual com criança (s), pré-púbere (s), em geral, 13 anos de idade ou menos), de forma não-transitória, ou seja, que tenham ocorrido por um período mínimo de seis meses e que lhe causem dificuldades psicossociais.

Relatos de detentos

Dentre os relatos assustadores a profissional destacou um, em que o agressor não diferencia a atração sentida por uma criança e uma mulher. “Uma criança ou um adolescente é como se fosse uma mulher para mim. Eu não vejo uma menina de 10, 12, 4, 5, 6 anos, como uma criança, eu vejo como uma mulher. Então, a gente já percebe que esse sujeito tem o transtorno, tem uma doença e que a gente sabe que é uma doença que precisa de um acompanhamento, tanto psiquiátrico, quanto psicológico”, ressaltou.

As verbalizações dos indivíduos quanto ao significado e o entendimento de ser criança foram mencionadas nas pesquisas como argumentos reais que demonstram a harmonização do socialmente aceito durante avaliação, demonstrando que possuem forte capacidade cognitiva de distinguir o “certo” e o “errado”. No entanto, a literatura é clara quanto as cognições dos abusadores e justificam que os pedófilos apresentam cognições distorcidas sobre sentirem atraídos por crianças.

“Os abusadores não acham que causam danos físicos/psicológicos à criança ao abusarem dela, pois acreditam que, pelo fato da criança não apresentar comportamento agressivo durante sua investidura, está é passível de sexo, e consequentemente, sentem-se atraídos reiteradamente por crianças ou adolescentes”, aponta o estudo.

Pensamentos e sentimentos antes e durante o abuso sexual

Dentre as 11 perguntas escolhidas pelas pesquisadoras, os encarcerados  responderam questão sobre o pensamento antes e depois de cometer o ato sexual. Dentre as respostas estavam:

 “Antes de praticar o abuso sexual eu pensei que teria prazer. Durante a relação sexual eu senti desejo pela criança. Quando terminei a relação sexual pensei que estava tudo bem e a emoção que eu senti após a relação sexual foi culpa”.

“Antes de praticar o abuso sexual, veio o pensamento de ter relação sexual com a criança. Senti o desejo da carne. A gente tava deitado na rede e senti desejo de ter relação sexual com a criança. Fazer relação sexual com a criança foi o meu erro”, destacou o identificado pelas inicias P.M

“Ates de ter relação sexual com a criança eu não pensei. Foi somente depois que cheguei à conclusão que tinha feito algo errado” (P.i)

“Antes de praticar a relação sexual com a criança, não pensei nas consequências do que iria acontecer com a minha família, com Deus”

“Antes de manter relação sexual com a criança, não consegui pensar, somente depois que fui pensar”.

Conforme destacam na pesquisa, tais cognições confirmam que estes tipos de sentimentos distorcidos tendem a desrespeitar e ignorar as vontades e desejos dos outros e ainda priorizam suas necessidades nefastas, desconsiderando a moral dos seus atos.

“Embora, um crime sem precedentes, vem crescendo no Brasil; dos 184.524 casos de violência sexual notificados, 58.037 foram contra crianças, cerca de 31,5% do total, entre o ano de 2011 a 2017. “Ainda existem grande dificuldade em pesquisar este público e buscar instrumentos que proporcionem prevenção e tratamento significativo, não só para as vítimas, mas também para os abusadores, afim de inibir a ameaça recorrente e incentivar gestores públicos, pedagogos, psicólogos e demais agentes de saúde para que práticas de prevenção sejam mais efetivas”, finaliza a pesquisa.

O Impacto

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