Reflexões continuadas sobre criminalidade, as mídias no Brasil e o funcionamento atual do Poder Judiciário!

Por Dr. Edison Messias de Almeida

Como antes dissertei, a gente assiste e continuará a assistir, diariamente, ao vivo e sob diversos matizes, o que alhures já se chamou de “metabolismo da criminalidade”. É algo chocante, muito difícil de se assimilar, espantoso mesmo, porque nem é preciso sairmos de nosso lares para vermos tragédias humanas, ocorrências banhadas de sangue, que os meios televisivos de comunicação massiva prodigalizam, grotescamente. Tenho isso como um espetáculo desumano, decorrente da eclosão generalizada e incontrolável do crime, em todas suas torpes modalidades.

Pior, diante desse quadro de horrores, não há quem não propague a ideia de combate ao crime por meio da majoração das penas e até mesmo de sua ampliação para a adoção da pena capital ou da prisão perpétua. Todavia, como antes me pronunciei, tal pretendida inclinação política não passa de uma panaceia, porque a utilização exclusiva do direito penal, como remédio eficaz na contenção do crime, é inócuo e uma experiência malograda, eis que o sistema jurídico-penal só está preordenado a defender a sociedade em limites bem definidos de aplicação e precária execução da pena, porque se trata de uma ciência de repressão social ao crime e nada mais e, ainda assim,  seletivamente: prendem os “criminosos de macacão” e “soltam os de terno e gravata”, (white collar) tal qual como preconizou Edwin Southerland, há quase um século e a assertiva certeira remanesce intacta no Brasil varonil, também de corrupção secular, como se lê em “Oração aos Moços”, de Rui Barbosa, perante a Academia Brasileira de Letras, em 1921 e o registro ominoso de que no Brasil de um século atrás “o homem honesto tem vergonha de sê-lo” e hoje, o que diria o paladino das liberdades públicas?

À Criminologia, todos deveriam saber, cabe o estudo e a busca da etiologia (causação do crime ou ciência causal-explicativa e da terapia), invariavelmente, de longo prazo, mediante tratamento empírico do fenômeno social do crime. Esse estudo transcende os balizamentos do direito penal e estão fora do alcance normativo dos Juízes em geral e do Ministério Público, agentes públicos, que, na sua maioria, até a desconhecem por completo e nem têm obrigação de saber, senão, por puro diletantismo. Num resumo apertado, é uma ciência multidisciplinar, que busca as origens e a natureza do homem por meio da antropologia criminal, sua interação social pela sociologia criminal, seu comportamento mental pela psicologia criminal e suas disfunções ou enfermidades mentais por meio da psiquiatria ou mesmo da neurologia criminal, distendendo-se à parte para o estudo pertinente às vitimas desse perverso fenômeno social e tem a preocupação de realmente combater a criminalidade, incumbindo ao legislador incursionar nessas áreas para traçar as políticas criminais. Num país como este isso é inalcançável!

Por isso, nossos Licurgos têm-se mostrado longe, bem longe desse ideário, por motivações diversas e conhecidas e porque só produzem uma messe de “leis da ocasião”, emergenciais, inclusive, defectivas de boa técnica, como vemos mediante comparação, e.g., nos tipos cunhados pelo vetusto Código Penal do País, de origem peninsular (italiano). Isso vem à baila em virtude do pacote supostamente do meteórico, polêmico, ex-Juiz Federal e Ministro da Justiça, ora Senador da República, Sérgio Moro, que buscaria o aprimoramento do processo penal brasileiro por meios de maior escarmento e de ampla e desproporcionada invasividade, que os juízes até hiperativamente prodigalizam e sob execução do organismo policial, de forma incontrolada, pirotécnica e por vezes, violenta, lembrando o odioso processo penal emanado da ditadura Vargas e da Carta Polaca de 1937. Tudo inócuo! Ao meu ver, tudo decorrente da vergonhosa falta de vontade política dos governantes de realmente combaterem essa grave fenomenologia, omitindo-se de investir para salvaguardar o direito de segurança jurídica, mais ampla possível, como preconiza o proêmio da Constituição pela verba legis do disposto no artigo 5º, caput, que não passa  de mais uma norma platônica, que nem programática se exibe, pela excogitação completa de um aceno de uma futura implantação empírica.

Afinal, em que país vivemos, ou o que somos o que queremos? Justiça! Volvamos nosso olhar para o Judiciário, um dos braços do Poder Estatal, instituição político-social, que se propõe dirimir conflitos sociais e sob contornos bem abrangentes, extrapolando a esfera individual, para se situar numa dimensão mais coletivizada na sociedade, à luz de uma Constituição, atualmente, toda esgarçada, moribunda, que se propunha a nos assegurar as liberdades públicas, ora travadas pela derrubada do veto presidencial na Lei 14.711/23, que regula o marco civil da Internet e nos submete a tratamento patológico no âmbito da liberdade de expressão, a um meio ambiente saudável, mas nunca praticado  e a um pretenso desenvolvimento autossustentável, a par do direito a uma vida digna e feliz no meio social com direito à informação autêntica dos fatos, não sob a batuta dos que só relevam aos grupos de interesse e não propriamente à coletividade. Nada disso que se almeja se assiste no País.

Impossível não se enxergar as transformações deste século, confrontando-nos numa conjuntura social, política e cultural, sob formas, até então desconhecidas, de interação social, com os avanços na biotecnologia, na informatização, nas modernas mídias digitais, mas nos desafiando ao enfrentamento de novas exigências e de convivência intersubjetiva, com reflexos na atuação do Poder Judiciário, convocado a amansar os conflitos daí decorrentes.

Tudo isso nos impele a desejar uma transformação mais intensa e profunda no Poder Judiciário, como órgão estatal de gestão da justiça, que pressupõe, urgentemente, uma verdadeira reconstrução, sob perspectivas mais condizentes do que as atuais, em razão das necessidades e das relações de seus componentes entre si, com a comunidade de jurisdicionados e igualmente com os demais órgãos do Poder, bastando recordar que o Judiciário, quando me graduei, não se investia de competência jurisdicional para o controle de legalidade dos atos políticos. Palavra de ordem é refazer o Judiciário em suas dimensões organizacional e institucional, frente a um padrão de cidadania mais exigente, de uma mais eficaz e satisfatória prestação de serviços jurisdicionais, tal como na saúde, educação segurança e habitação todos carentes e o STF guardião e não excedendo as balizas nela fincadas.

Afinal a Justiça é um bem que a todos nos afeta, seguramente, a mais importante para a estabilidade do convívio harmonioso em sociedade.

Um primeiro passo se impõe! Por de lado definitivamente esse aparato formalístico, antipático, que o distancia do povo, atuando como um poder que se oculta, sob um linguajar estéril, sem se preocupar em construir um mecanismo que o retire desse caos em que se  transformou, como um cemitério de processos, pelo absurdo que representa inúmeros deles com mais de vinte anos de tramitação. Justiça tardia pode ser tudo, menos Justiça.

O direito fundamental à tutela jurisdicional ou acesso efetivo à justiça é o objetivo primordial dessa transformação, afastando todo e qualquer óbice na busca de uma adequada solução à medonha tardança de seu funcionamento, sem o quê não se obtém o pleno exercício da cidadania, sob um sistema processual burocratizado, lotérico, tardonho e ininteligível para o homem do povo, entre outros aspectos relevantes.

Toda a comunidade nacional reclama o excesso de formalismo processual, a aparente falta de estruturação dos tribunais, a escassez de produção do trabalho de muitos juízes, facilmente detectável, para além da inútil e complexa sistemática recursal vigente, que só vige na aparência, porque o acesso aos tribunais superiores existe na legislação, sob explícita reserva legal em qualquer processo judicial, o que seria expectativo que os tribunais se obrigassem a se pronunciarem sob precisos fundamentos e enfrentamento temático como impõe com a cogência característica das normas impositivas o artigo 489, § 1º, inciso IV. do CPC, que, infelizmente, o STJ revogou, contrariando a natureza dialógica Processo e o princípio básico da dialeticidade, paralelamente à postura, sob repercussão geral, do STF de riscar da Constituição o recurso extraordinário fundado nas cláusulas pétreas do direito de ampla defesa, contraditório, motivação e devido processo legal, rebaixados para o plano infraconstitucional e afinal todos esses apelos extremos, majoritariamente, na prática diuturna, são denegados ou, sequer, admitidos, em proporções absurdas, de quase 100%, sejam fundados ou não. Há quem diga que os tribunais brasileiros entregaram o ofício aos assessores e à estagiocracia, que trocaram as sinapses pelas sinopses. Não sou eu que digo! Só repito.

Em síntese, a ideia central até aqui divisada é a realização da efetividade e celeridade da intervenção do Judiciário, do que já se teria um esboço nas instituições das temáticas da Repercussão Geral e das paradigmias de Repetitividade, Súmulas Vinculantes ou não, controle concentrado da Constitucionalidade, oponível erga omnes, antecipação de tutela provisória, submetida ao subjetivismo de cada órgão Julgador, singelo ou fracionário, segundo os ditames de sua consciência ou de sua conveniência. Afinal cada povo tem a Justiça que merece!

O Impacto

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