Estudantes surdos se formam no curso de licenciatura em libras
Quarenta e três alunos surdos se formaram no curso de licenciatura em letras/libras (linguagem brasileira de sinais) à distância na noite desta segunda-feira (11) no auditório da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de São Paulo (USP). A cerimônia em São Paulo reuniu apenas os estudantes que utilizaram a USP como polo presencial. A graduação é da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e atendeu estudantes de outros oito polos espalhados pelo Brasil.
O curso foi iniciado em outubro de 2006 e concluído em dezembro do ano passado. A cada 15 dias, no mínimo, sempre ao sábados, os estudantes participavam de aulas presenciais com videoconferências. O conteúdo foi baseado em disciplinas de pedagogia, linguística e tradução e interpretação.
A cerimônia de formatura foi acompanhada por intérpretes que a traduziam na linguagem de sinais e tinham sua imagem projetada em um telão. A cada formando que recebia o canudo, a turma chacoalhava as duas mãos para o alto, sinal que representa uma salva de palmas.
Com o diploma, os estudantes estão habilitados a atuar como professores de línguas de sinais, porém a maioria já está na área. É o caso de Neivaldo Augusto Zovico, que tem licenciatura em matemática, pós-graduação em educação de surdos e dá aula de matemática em libras em duas escolas para surdos em São Paulo. “Antigamente os surdos não tinham profissão, por isso cursos como estes quebram paradigmas. Muitas pessoas acham que nós nos comunicamos por meio de gestos. Mas não é isso, através das libras, temos nossas gírias, poesias e até piadas. Há um status de linguagem”, diz Zovico, por meio de libras, traduzidas à reportagem por uma intérprete.
Sylvia Lia Grespan Neves, de 42 anos, também era uma das formandas. Ela já cursou biblioteconomia, pedagogia e fez mestrado em educação, mas afirma que a ocasião era especial porque era a primeira vez que se formava com colegas surdos. “Dou aulas de libras, fiz pedagogia, mas aqui o curso foi mais específico com estudos de gramática, que é o foco do meu trabalho”, afirmou Sylvia, também em libras.
Sylvia nasceu surda e ensina a linguagem de sinais em universidades para estudantes ouvintes.
Para Eduardo Pereira Rocha, de 28 anos, a graduação foi só o primeiro passo da vida acadêmica. Ele trabalha como instrutor de libras, e pretende fazer pós-graduação na área de educação. “O primeiro desafio foi aprender a lidar com o ensino a distância. Mas valeu muito a pena porque além de conhecimento houve a troca de experiência entre os alunos”, diz Rocha, por meio dos sinais.
Nas atividades em casa durante o curso, os alunos assistiam a vídeos em libras, tinham espaço para postar outros vídeos, além de propor fóruns de discussão.
A coordenadora geral do curso a distância, Marianne Stumpf, de 37 anos, que também é surda, disse que os conhecimentos adquiridos pelos formandos devem ser multiplicados para que haja uma mudança sobre a visão do profissional surdo.
Para Tarcísio de Arantes Leite, de 34 anos, que foi o tutor do polo de São Paulo e dá aulas no curso presencial em Santa Catarina, os docentes desta área precisam reaprender antes de ensinar. “Quem trabalha com surdez precisa repensar o estudo, que geralmente é feito com base nas línguas orais. Também é necessário conhecer a realidade do aluno e adaptar o ensino.” Leite lembra que geralmente o surdo tem dificuldade com a língua portuguesa e nem sempre lê ou escreve bem.
A Universidade Federal de Santa Catarina oferece também o curso presencial de licenciatura em libras, além do bacharelado em libras que habilita o profissional a atuar como intérprete e tradutor.
Do G1