Construção de “Shopping Popular” na Praça Rodrigues dos Santos gera polêmica
Por Diene Moura
O Prefeito de Santarém, Nélio Aguiar, assinou a ordem de serviço que autoriza a implantação do Camelódromo Municipal, conhecido também como “Shopping Popular”, no dia 11 de novembro de 2021. A cerimônia ocorreu no Centro Municipal de Informação e Educação Ambiental (Ciam) e contou com a presença do secretário de Infraestrutura, Daniel Simões, vereadores e representantes dos permissionários dos mercados.
Na terça-feira, 4 de janeiro de 2022, a primeira etapa das obras na Praça Rodrigues dos Santos, onde será construído os 100 boxes em alvenaria iniciaram com a derrubada de 11 árvores. De acordo com o Chefe de Manutenção da Secretaria Municipal de Agricultura e Pesca (Semap), Anatholy Branco de Moraes, a retirada da vegetação ocorreu após autorizações de órgãos ambientais.
“Foram feitas análises ambientais, com autorizações expedidas pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semma), de corte e transplantio de algumas árvores que são menores para outros locais. A previsão para finalizar a primeira etapa é até o dia seguinte, se a chuva permitir. A Seminfra, SMT, SEMMA e SEMAPA estão em trabalho conjunto nesta ação”, disse o chefe de fiscalização.
Há muitos anos, as mais de 100 pessoas que ocupam a Praça da Matriz sonham com condições melhores de trabalho, principalmente no período do inverno amazônico.
“A construção do nosso camelódromo é um sonho antigo, nosso Presidente Sousa vem lutando há vários e vários anos para isso acontecer e agora parece que as coisas vão andar, porque aqui todo mundo sabe que é um sofrimento muito grande, principalmente no inverno, você monta banca, desmonta banca, quando dá uma chuva muito forte molha a mercadoria. Uma vez minha banca virou, quebrou um monte de ferro. Tem que agilizar, mandar soldar e no outro dia esperar o tempo limpar para trabalhar, mas aqui no tempo de inverno é só Jesus mesmo pra ajudar a gente”, disse Girleno Alves dos Santos, Camelô há 8 anos na Praça da Matriz.
Além das fortes chuvas, os trabalhadores também têm sua fonte de renda afetada, pois pagam aluguéis de galpões para armazenamento de suas mercadorias e mais uma taxa anual de ocupação pública no valor de R$ 316,00 à Prefeitura.
“No final do dia você vai ver, pagou pra carregar, pagou pra montar, ai vai ver o lucro foi todo embora. Mas graças a Deus nosso sonho estão construindo e com fé em Deus vai dar tudo certo, vamos parar com esse sofrimento. Teremos um lugar digno para trabalhar. Um espaço melhor, mais confortável para os clientes fazerem suas compras, aqui vem um cliente e fica debaixo de chuva para ser atendido e lá vai ser tudo diferente. Todo mundo concordou com o local, bem localizado, todos estão satisfeitos. E é o sonho de todo mundo sair da rua e ir pro boxe trabalhar honestamente, não é como muitos falam na rede social que é mercadoria roubada. Graças a Deus todos aqui somos trabalhadores, pais de famílias e honestos”, finalizou Girleno Santos.
A obra na Praça Rodrigues dos Santos vai contar com 100 boxes em alvenaria, porta de rolo, telhado em cerâmica e forro em PVC, cada um com 4,80m² de área. A construção completa do terá 521,75m² de área e está orçada em R$1.069.626,12, recurso do Governo Federal, via Ministério do Desenvolvimento Regional e contrapartida da Prefeitura de Santarém. A empresa vencedora da licitação e responsável pela obra é a Sollos Construtora Ltda, que terá o prazo de 8 meses para a entrega do novo espaço.
A articulação para a construção do Camelódromo Municipal resolve um problema histórico e atende uma reivindicação antiga. “A gente fez uma reunião com a associação (dos trabalhadores ambulantes), que tem um cadastro das pessoas. Conseguimos o recurso e com uma contrapartida da Prefeitura de Santarém para realmente dar uma estrutura adequada na Praça Rodrigues dos Santos. Essa praça é mais utilizada para estacionamento, vamos dar uma revitalizada na praça e construir também nela o ‘Shopping Popular’– confirmou o prefeito Nélio Aguiar.
Embora seja uma obra importante que dará mais dignidade para aos ambulantes com um espaço estruturado, coberto, que vai proteger as mercadorias e evitar perdas de produtos, a derrubadas das árvores no local escolhido para a construção dividiu opiniões e preocupou membros do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós (IHGTap), que protocolaram um documento no Ministério Público, questionando o início das obras do “Shopping Popular”. “O IHGTap recorre a esta Promotoria de Justiça com o fito de buscar esclarecimentos a respeito da obra a ser construída no logradouro referenciado, para conhecimento e aferição de legalidade e responsabilidade”, afirma o documento protocolado no MP.
PRAÇA CENTENÁRIA
O instituto diz no documento que a “centenária Praça Rodrigues dos Santos faz parte do contexto histórico, cultural e arqueológico do município. Em 1661, o padre João Felipe Bettendorff abriu um ‘largo’ junto da Igreja de Nossa Senhora da Conceição para nele fazer o trabalho de catequese dos Tapajós e outros povos indígenas que foram aldeados na Missão Jesuíta. Os indígenas chamaram aquele lugar de Ocara-Açu, que quer dizer ‘Terreiro Grande’. De lá para cá, Ocara-Açu teve outras denominações, algumas delas oficiais e outras de caráter popular”.
Apresentando vários detalhes históricos, o pedido do instituto cita documentos como a Lei Municipal Complementar 007/2012, que regula o parcelamento, uso e ocupação do solo do município de Santarém que, em seu artigo 8º, define como de “relevância cultural, histórica, paisagística, turística, urbanística, arquitetônica e ambiental da paisagem notável da área e/ou do entorno”, que coloca a praça dentro da área poligonal da Zona de Preservação do Patrimônio Cultural do Município (art. 22); O Código de Posturas do Município de Santarém, e a Lei Municipal Nº 20.534, de 17 de dezembro de 2018, que instituiu o Plano Diretor Participativo do Município de Santarém, este último citando, entre outros, o art. 140, que define como “Zona de Interesse”, em sua alínea VI – “De proteção do patrimônio histórico – são aquelas áreas que por seu valor histórico, arqueológico e antropológico devem ser preservadas”.
A Historiadora e Presidente do Instituto, Terezinha Amorim, finaliza dizendo que o IHGTap quer que o MP busque “esclarecimentos perante a municipalidade sobre a aludida edificação na Praça em comento, e outras medidas que entender necessárias sobre a melhor forma de preservar este espaço de Memória Histórica do Município de Santarém”. A promotora recebeu o documento na manhã de quarta-feira (5/01) e disse que analisaria o pedidos.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA (ACP)
Após análise e diante da gravidade dos fatos relatados pelo IHGTAP, o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) ajuizou, ainda na quarta-feira, Ação Civil Pública (ACP) em desfavor da prefeitura de Santarém. A peça judicial solicita a responsabilização por danos causados ao meio ambiente, assim como ao patrimônio histórico-cultural do Município de Santarém.
O fiscal da lei solicita, entre outras medidas, que seja suspensa de forma imediata a construção do “Camelódromo” na Praça Rodrigues dos Santos, até que sejam realizados estudos de impacto da obra ao patrimônio histórico do Município, assim como seja realizada a discussão do respectivo projeto com a Comunidade Santarena.
Também é solicitado bloqueio online no valor de R$100.000,00 (cem mil reais) das contas dos requeridos, em caso de descumprimento da decisão judicial, sem prejuízo das demais meio de execução contra a fazenda pública previstos no ordenamento jurídico brasileiro.
ATUALIZAÇÃO
Na manhã desta quinta-feira (6), a Juíza Plantonista Carolina Maia, não apreciou a liminar da Promotora Lilian Braga, a qual solicitava a suspensão das obras na Praça Rodrigues dos Santos. De acordo com Carolina Maia, o pedido em tutela de urgência não é um caso para juíza de plantão, que está atuando durante o recesso forense. A ação foi transferida para outro magistrado que assumirá a partir de amanhã (7/1).
RG 15 / O Impacto
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