Membros de Comissão da Verdade pregam investigação sem revanchismo
Escolhido pela presidente Dilma Rousseff para compor a Comissão da Verdade, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Gilson Dipp afirmou nesta sexta-feira, 11, que o trabalho do colegiado poderá contribuir para a “reconciliação nacional” sem nenhum “revanchismo” e que atuará “doa a quem doer”.
O magistrado acredita que não haverá resistência às investigações do grupo, que começa os trabalhos oficialmente na próxima quarta-feira. “Não (haverá resistências). Acho que a sociedade como um todo vai absorver o sentido da lei (que criou a Comissão da Verdade, de novembro do ano passado), que é resgatar a memória nacional, trazendo à tona violações graves dos direitos humanos, reconstruindo a história e fazendo a pacificação nacional”, disse Dipp, no intervalo do encontro da comissão de juristas do Senado que discute mudanças no Código Penal.
Para o ministro do STJ, a intenção da lei não é revanchismo a qualquer pessoa ou grupo: “É a procura de uma reconciliação nacional, doa a quem doer”.
O magistrado, que foi elogiado pelos colegas da comissão de juristas durante a sessão, contou que recebeu a primeira sondagem para compor a Comissão da Verdade há 48 horas e o convite de Dilma na quinta-feira à tarde. “Eu fui pego de surpresa”, afirmou Dipp, que não quis adiantar nenhuma linha de atuação do colegiado antes de se encontrar com os outros seis integrantes.
Para Dipp, a comissão é uma questão do “Estado brasileiro” e “não de governo”. O ministro do STJ disse que desde o governo Fernando Henrique Cardoso, passando pela gestão Lula, e agora com Dilma Rousseff, o tema vem sendo debatido.
Ele ressaltou que comissões desse tipo têm sido abertas em várias nações que passaram por violações de direitos humanos. “Então o Brasil está caminhando na mão certa”, disse.
O magistrado acrescentou que não é um problema o Brasil ter demorado a criar sua Comissão da Verdade. “Temos que trabalhar com a nossa realidade, com aquilo que vamos deliberar. A questão é nossa, a responsabilidade é nossa.” Dipp disse que “certamente” o propósito da comissão será cumprido.
Prazos. Pela lei que a criou, o grupo terá dois anos para apurar violações aos direitos humanos entre 1946 e 1988, período que abrange a ditadura militar. Ao fim dos trabalhos será produzido um relatório com as conclusões dos crimes investigados. Mas a Lei de Anistia, de 1979 e mantida em vigor por decisão do Supremo Tribunal Federal, não permite a punição de pessoas envolvidas com os crimes.
Questionado se o País poderia ir além, punindo agentes do Estado ou militares, ele respondeu: “Não vou fazer este comentário porque não estou autorizado a fazer, por enquanto”.
Sem revanche. Também integrante da comissão, o ex-procurador-geral da República Claudio Fonteles disse que o papel será “buscar a reconstituição da história sem nenhum tipo de revanchismo” ou perseguição. “Não há espaço para isso”, ressaltou ele, assegurando que “ninguém vai perseguir ninguém”, até porque existe a Lei de Anistia, que vale para todos os lados. “Temos de virar esta página da história do Brasil. Precisamos criar uma memória e estabelecer a verdade, mas ninguém vai reescrever a história”, avisou ele.
Segundo Fonteles, que foi procurador no primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, “existe uma lei que reconhece que o Estado brasileiro violou os direitos humanos”. “É aí que vamos reconstituir a história, aproveitando já o trabalho da comissão de mortos e desaparecidos políticos do Ministério da Justiça.” Para ele, “nenhum Estado pode violar os direitos humanos e o que se pretende com a comissão é evitar que estes fatos se repitam”.
De acordo com Fonteles, não há o que temer os militares. “Ninguém vai perseguir ninguém. Existe uma lei de anistia em vigor”, declarou. Questionado sobre a revisão da Lei de Anistia, foi taxativo: “Impossível”.
Fonte: Estadão