Farinha não é a vilã do recorde nacional de câncer gástrico no Pará

Dr. Jorge Ohana

Belém vai sediar de 1º a 4 de junho, a 1ª Amazoníada de Doenças Digestivas, coordenada pela Sociedade Médico do Pará. O tema será: Integrando conhecimento com sustentabilidade. O local será o HANGAR-Centro de Convenções da Amazônia. Câncer gástrico e do colo retal, hepatites virais, as colites e muitos outros assuntos serão abordados. 28 professores do Brasil e 3 do exterior. O ministro Alexandre Padilha foi convidado para ser o presidente de honra do encontro.

A atração é o intestino gigante, com 20 metros de extensão, uma concepção artística em formato de túnel, onde se percorre os órgãos e posem ser vistas as inflamações do aparelho digestivo. Em cada estação, um monitor de plasma, a um simples toque, aparecem as explicações com linguagem acessível.

O Amazoníada tem a proposta de ser itinerante. Santarém é candidata a sediar o segundo encontro, no próximo ano, como a primeira cidade do interior a receber um evento dessa dimensão.

O convite foi feito no começo da semana ao Secretário de Saúde Municipal, José Antônio Rocha. O médico gastroenterorolista Jorge Ohana, um dos coordenadores do 1º Amazoníada, esteve em Santarém, e concedeu uma entrevista a O IMPACTO.

O IMPACTO: Dr. Jorge, o que representa, para o Pará, sediar um encontro como esse?

Dr. Jorge Ohana: Como sabemos, a Amazônia é heterogênea, com características distintas. Esse fórum é um resgate de alguns assuntos que nos afligem diretamente, trazendo a experiência dos que moram na região e ouvindo a experiência daqueles que vem de fora. Profissionais de renome inclusive internacional, vão participar conosco. A partir daí, vamos extrair documentos que serão encaminhados, para as autoridades em todos os níveis da Federação.

O IMPACTO: O que os organizadores esperam como resultado imediato?

Dr. Jorge Ohana: O Primeiro resultado imediato é educação continuada e a qualificação dos médicos participantes. Na nossa região pelas grandes distâncias eles não se deslocam normalmente aos grandes centros. Isso vai permitir que sejam estimulados transplantes, principalmente de fígado. Não se tomam medidas práticas para combater, por exemplo, o câncer de estômago, uma vez que o Pará é o campeão nacional de câncer gástrico.

O IMPACTO: A farinha é a vilã do alto índice da doença entre os paraenses?

Dr. Jorge Ohana: Nem a farinha, e nem a água, como já se disse antes. Nós não podemos incriminar a farinha. O que é fator determinante é o uso indiscriminado de sal, consumido habitualmente, alimentos enlatados, embutidos a presença da bactéria H. Pilorys, e um histórico familiar. Mesmo com a chegada da energia elétrica no interior, ficou o hábito de se comer salgado, e isso ficou arraigado. Aqui na região Oeste do Pará há nichos de prevalência do câncer gástrico, mas não pior do que na região do salgado, da linha do Marajó até o limite da costa do Maranhão. Em um encontro como o Amazoníada, esperamos contribuir, orientando os pacientes a comerem frutas, verduras, legumes e evitando comidas salgadas. A presença da nitrosamina também é fator relevante.

O IMPACTO: Como estabelecer uma alimentação adequada, numa região como esta, onde os pacientes não têm acesso aos nutrientes mais elementares, para uma dieta sadia?

Dr. Jorge Ohana: Uma coisa é se alimentar bem, a outra coisa é comer bem. Há casos em que tem que se comer o que tem e o que pode. Usar no cardápio, bastante peixe, carne branca, evitar salgados e embutidos, até os refrigerantes diet. Você não pode fazer isso como rotina.

O IMPACTO: A vulnerabilidade social pode impedir que seja cumprida uma dieta alimentar, em uma família que depende em grande parte de programas sociais do governo Federal, por exemplo?

Dr. Jorge Ohana: Este é um problema social e relevante, mas nem por isso, sem solução. Esta região teve o privilégio de contar por muitos anos, com a médica Clara Takaki Brandão. Essa mulher é fantástica, criou uma forma de aproveitamento a partir das sobras de alimentos, rios em fibras, que seriam descartados. Eu estou falando da multimistura, concebida a partir de uma experiência espetacular, como a da Dra. Clara. Ela deixou um legado de como fazer alimentos saudáveis, gastando muito pouco, e com resultados impressionantes. Devo citar também, o médico Camilo Viana, que também tem uma experiência muito grande nessa área. Como você vê, não precisa ser rico pra comer bem. Você pode comer bem sem ser rico. As sobras são mais saudáveis. É só saber aproveitar adequadamente.

O IMPACTO: O paraense é vítima do câncer gástrico. Cite outro exemplo de outras regiões do Brasil, onde algum hábito peculiar à região de origem, e que trás também, algum tipo de câncer, comum, em razão de hábitos alimentares?

Dr. Jorge Ohana: Cada um com as suas mazelas. A figura do gaúcho que toma chimarrão, bebe vinho e fuma, trás a prevalência de câncer do esôfago e garganta. Um encontro como esse, gera especulações, onde as pessoas esperam soluções mirabolantes. Às vezes elas estão nas coisas mais simples, com resultados positivos.

O IMPACTO: Santarém pode sediar o próximo Amazoníada. Que critérios pesaram nessa escolha?

Dr. Jorge Ohana: Este é um fato curioso, inclusive porque quando foi discutido, qual seria a próxima cidade a sediar o encontro, Santarém ganhou por unanimidade. Esta cidade tem a sua importância geográfica, e está localizada em um lugar encantador. Eu estou muito otimista, já que o Secretário de Saúde, José Antônio Rocha, foi muito receptivo e nós já estamos costurando isso. Só depois de Santarém, Manaus vai ser sede do Amazoníada. Belém só vai voltar a sediar o encontro depois que haja o evento em todas as cidades mais importantes da Amazônia. Alter-do-Chão é um grande atrativo, para eventos como esse. Lugares paradisíacos como esse proporcionam a oportunidade de trazermos para Santarém, palestrantes de renome.

O IMPACTO: Voltando às nossas mazelas, com perceber, que se está prestes a adquirir uma doença recorrente?

Dr. Jorge Ohana: É preciso estar atento aos estudos epidemiológicos, como a doenças de chagas, malária, calazar e hanseníase. Não podemos ter um prato feito. O importante é estar vigilante para as doenças típicas de cada região. O problema que acontece, é que o paciente quando procura um médico já vem com a doença às vezes em estágio avançado. Não se morre por acaso. Costuma-se dizer que alguém estava bom e de repente morreu. Vai ver que ele já sentia alguns sintomas e não ligou como: dor epigástrica, a chamada dor de boca de estômago, náuseas, cefaléia, empachamento. Cabe ao médico fazer o diagnóstico, e encontrar a solução.

O IMPACTO: Quais os maiores desafios para as doenças gastrintestinais?

Dr. Jorge Ohana: Com toda certeza, o câncer, mas se diagnosticado em tempo é fácil de ser resolvido.

O IMPACTO: Alguma coisa a mais que o senhor queira acrescentar?

Dr. Jorge Ohana: Quero agradecer o carinho com que fui recebido em Santarém, e deixar o endereço onde vocês vão encontrar todas as informações necessárias sobre a realização da 1ª Amazoníada de Doenças Digestivas: www.amazoniadadigestiva.com.br digestiva.com.br. E até o próximo ano, aqui em Santarém.

Por: Carlos Cruz

 

Um comentário em “Farinha não é a vilã do recorde nacional de câncer gástrico no Pará

  • 26 de maio de 2011 em 14:38
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    Excelente reportagem !

    Parabéns ao Dr Jorge Ohana e ao impacto por disponibilizarem tantas informações úteis para todos nós.

    Carlos França

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