Pesquisadora: Cardápio com ossos de cadáveres

Arqueóloga Denise Schaan chefiou pesquisa histórica

Um Porto, muitas histórias. Este é o tema da expedição arqueológica aberta na noite de quarta-feira (18), no Centro Cultural João Fona, em Santarém (PA). Resultou da pesquisa que começou em 2009 sob a coordenação da Universidade Federal do Pará (UFPA), e parcerias da Companhia Docas do Pará e Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), abriu um leque de informações sobre salvamentos arqueológicos dos primeiros habitantes de Santarém. Povo guerreiro que possuía estratificação social e abundância de alimentos.

Pelos menos 5 mil peças, principalmente de cerâmica e pedras, foram encontradas durante as escavações na zona portuária, mais precisamente na área do porto da Companhia Docas do Pará.

Os contextos dos objetos encontrados apontam para descobertas no mínimo curiosas, conforme informações da coordenadora da pesquisa, a arqueóloga Denise Schaan. A exposição é apenas uma das ações do salvamento arqueológico. Um trabalho de Educação Patrimonial caminha paralelamente com a pesquisa, envolvendo alunos das diversas escolas de Santarém.

Segundo a pesquisadora, “muito já se falava do material arqueológico daquela área, principalmente durante o processo de implantação do porto, mas não se tinha conhecimento do que e onde estavam os objetos”. Ela ressaltou que “foi encontrada uma área de sepultamentos, com urnas funerárias. Nunca se tinha encontrado uma urna funerária durante esse tipo de trabalho”.

Durante uma entrevista exclusiva ao IMPACTO, a arqueóloga confirmou o que os missionários já diziam, mas não havia prova material de que os índios Tapajós moíam ossos e bebiam uma espécie de sopa desses fragmentos de ossos.

“Eu chamo isso de canibalismo funerário, ou alguma coisa desse tipo, mas na verdade, isso não implicava em matar pessoas. Somente depois da pessoa morrer é que se fazia isso com os ossos“, assegura a pesquisadora.

Pesquisadores descobrem peças de cerâmica, no porto da CDP - Santarém

Foram encontradas pelo menos 14 urnas na área que seria um cemitério indígena. Outra revelação interessante foi a localização daquilo que os pesquisador Frederico Barata na década de 50 chamou de “bolsões”. Eram buracos transformados em lixões, com uma peculiaridade: as covas tinham o mesmo tamanho, em formato alongado e devidamente alinhados.

Dentro desses “bolsões” foram encontradas muitas cerâmicas decoradas, fragmentos de vasos e estatuetas.

Não menos interessante foi encontrar também “material lítico”, que eram as oficinas de fabricação de instrumentos de pedra. Os Tapajoaras usavam “abrasadores”, material resistente que funcionava como se fosse lixa para dar formato a objetos utilitários como machados.

“Roca de fuso” foi encontrada em abundância. Perguntada sobre qual utilidade dessas tais rocas, a pesquisadora Denise responde: “Essas rocas serviam pra mover a fiação, o que significa dizer que eles faziam tecidos, uma modalidade avançada para a época”. Material semelhante já foi encontrado até 75 quilômetros da área que hoje é o centro da cidade.

“Era um povo demograficamente numeroso. Eu acredito que aqui devia ser a capital deles”, garante a pesquisadora. A semelhança com os achados também trás uma revelação. A Venezuela teria sido o início de uma rota que teria começado há mais de 2 mil anos. As incisões, ponteado e modelagens de figuras de animais, são traços marcantes das peças encontradas na área pesquisada. Animais com duas cabeças retratadas nas peças podem ser inspirados em histórias miológicas.

A figura do sapinho, conhecido como muiraquitã, também se apresenta de uma forma bem forte na região. Prova disso foi o achado de um “legítimo muiraquitã”, com apenas 2 centímetros. A peça é tão valiosa, que quem visitar a exposição, só vai poder ver a foto do objeto.

“É a primeira vez que se acha um muiraquitã, no contexto de uma escavação. Nós o encontramos na parte superior de bolsão”, lembra a pesquisadora.

Muitos outros objetos poderiam ser encontrados, mas o local da pesquisa já sofreu muitas alterações. A terra preta que havia antes na superfície já havia sido retirada para uso no cultivo de plantas e segundo a equipe de pesquisa, muitos objetos se perderam durante essas retiradas de material.

Matérias recentes como restos de material de construção, encontrados na área, são atribuídas à construção da estrutura do porto.

A UFPA está renovando o convênio com a CDP por mais um ano. No primeiro ano a pesquisa teve o apoio da Cargill. Já a UFOPA disponibilizou um local, que se transformou no único laboratório de arqueologia de Santarém, bancado pela CDP. Após o dia 20 de maio quando termina a exposição, todo o material exposto será levado para o laboratório de arqueologia.

O resultado da pesquisa serviu para o aumento do conhecimento científico, que revelou o cotidiano do povo que viveu aqui, e das suas práticas de fabricação de artefatos, com mais profundidade.

Parte do material coletado foi encaminhada para os Estados Unidos para que seja feita a “datação” dos achados, que vão revelar a cronologia do tempo de fabricação. O resultado deve ser conhecido no máximo em 24 meses.

A região da área conhecida como Taperinha, continua sendo o maior referencial de datação na região, com registros que remontam 8 mil anos.

Por: Alciane Ayres

2 comentários em “Pesquisadora: Cardápio com ossos de cadáveres

  • 20 de abril de 2012 em 13:23
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    DESVENDARAM UM GARIMPO SEM MALÁRIA .

    FICO FASCINADA COM NOSSA HISTÓRIA, IMAGINAR Q/ NA MISTURA DE POVOS Q/ EXISTE EM NOSSA SANTARÉM DO TAPAJÓS, NESSA EXÓTICA MISTURA NÓS TEMOS ANCESTRAIS Q/ SE ALIMENTAVAM DE OSSOS HUMANO DE CADÁVERES . ISSO NUM 1º INSTANTE CAUSA ESPANTO MAS NAQUELA ÉPOCA PRIMITIVA \”MESOZÓICA\” ERA NORMAL ! MINHA IMAGINAÇÃO VOA E FICA A DÚVIDA SE ESSE ATO ERA UMA REVERÊNCIA DE AMOR PERANTE SEUS ENTES QUERIDOS , OU de ódio perante os insuportáveis q/ faziam questão de SER INSUPORTÁVEIS,como um povo pácifico esperavam a coisa morrer e p/ cauterizar a raiva , tomavam SOPA ou suco de osso do CADÁVER HUMANO q/ em vida era um insuportável . (CLARO ISSO É UMA VISÃO PARTICULAR, MINHA. QUANDO LEIO COSTUMO IMAGINAR O Q/ ACONTECEU NAQUELA ÉPOCA).

    NOSSO LINDO E APRECIADÍSSIMO SÍMBOLO, O MUIRAQUITÃ ,ACHARAM UM ORIGINAL Q/ … NÃO TEM PREÇO!!

    Tem gente q/ ganha a vida achando verdadeiros tesouros arqueológicos. As cerâmicas tapajoaras são famosas e valiosas, quanto mais antiga mais valorosa ,no exterior são tbm megavalorizadas.

    BELO TRABALHO DA ARQUEÓLOGA. PARABÉNS!

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