Artigo | Everaldo Martins Neto | Coronavírus II: Esmagar a curva – Como o isolamento salva vidas
É bastante provável que todos nós já tenhamos nos deparado com o termo “achatar a curva” nas últimas semanas. Neste artigo, meu objetivo é explicar exatamente o que ele significa e como o isolamento social é bastante eficiente no combate ao coronavírus. Embora eu não vá conseguir responder todas as perguntas e preocupações, é possível constatar, a partir de uma análise comparativa da conjuntura internacional, algumas medidas a serem tomadas. Ao longo deste texto, vou citar alguns exemplos ao redor do mundo e traçar paralelos com a nossa região.
A principal questão a respeito do gráfico que você deve ter visto nas notícias e nas redes sociais é a capacidade e qualidade do sistema de saúde de um determinado país. A ideia é que o limite desse sistema não seja excedido para que mortes evitáveis não aconteçam. Por exemplo, se um país que tem um sistema de saúde precário, como os Estados Unidos, tiver que lidar com um número exorbitante de casos, é inevitável que ele vá entrar em colapso, como já começa a acontecer. Quaisquer outros casos que não sejam relacionados ao coronavírus não vão ter o atendimento adequado. Porém, a situação é grave ao ponto de que, mesmo que o SUS dos outros países seja bom, como na Itália, o número pode ser tão grande que ainda assim irá sobrecarregar, e médicos terão que escolher quem vive e quem morre, como tem sido rotina no país. É daqui que vem a importância de achatar a curva, e a negligência foi um erro que tanto Itália como Estados Unidos cometeram, e sofrem as consequências agora.
A “curva” é um número projetado de quantas pessoas serão infectadas ao longo de certo período e pode ter várias formas. Quanto maior e mais rápido ela subir, mais próximo o sistema de saúde está de colapsar. A chave para entender isto é compreender que o tempo de ação de governos é muito pequeno. Semanas fazem uma diferença imensa. Como foi dito, achatar a curva significa fazer com que não haja um pico muito grande de casos, o que sobrecarregaria o sistema de saúde. Ao invés disso, “distribuir” os casos por um período mais longo, mas de forma que os profissionais possam tratar os casos mais sérios, mantendo o sistema em funcionamento próximo do normal. A Itália foi bastante negligente há cerca de um mês, como já foi noticiado. O mesmo acontece agora nos Estados Unidos. Porém, nos Estados Unidos, assim como no Brasil, existem várias Espanhas, Irãs e Itálias, o que quer dizer que pode haver mais de um epicentro. É neste contexto que o isolamento se torna crucial.
Hoje, na Espanha, a situação ainda é uma calamidade, muito parecida com a da Itália. Por via de comparação, o Brasil teve números parecidos com estes dois países há algumas semanas, mas os governadores agiram relativamente cedo e rápido. Em duas semanas, se não estivermos como eles, com falta de equipamento e com idosos morrendo em casa, é sinal que as medidas surtiram efeito. Porém, é cedo para ter esperanças concretas. Acontece que, no Brasil, temos pouquíssima oferta de teste, o que nos deixa sem certezas sobre o número exato de infectados. Portanto, é crucial que nos isolemos na medida do possível. Tanto na Itália e na Espanha há sinais de que a curva pode estar achatando.
É importante frisar a importância da ciência nesse momento. Nós só estamos no meio dessas incertezas por conta do desinteresse, da falta de incentivos e da negação sistematizada da ciência que existe no nosso país. Átila Iamarino, um dos nossos melhores cientistas, explicou há poucos dias como algumas das pessoas mais qualificadas para estudar o coronavírus perderam a bolsa de estudos recentemente. Que tenhamos esta pandemia como uma lição para o futuro que queremos como país. Que sigamos os exemplos de países como Cingapura, Coreia do Sul e Taiwan, que embora próximos ao epicentro da doença, tomaram medidas cedo e agora veem os impactos na economia serem minimizados.
No caso do Pará, acho importante reconhecer o trabalho do governador Helder Barbalho. Meu elogio vem do campo das Relações Internacionais. Como foi mencionado, o fato de ainda estarmos lidando de forma consciente e dentro dos limites é sinal de que as medidas estão surtindo efeito. A construção de leitos também é de suma importância. Precisamos todos colaborar. Essas medidas foram recomendações padrão da Organização Mundial da Saúde, que consulta cientistas renomados na sua tomada de decisão. Porém, também tenho uma sugestão que vem da minha análise de Relações Internacionais: é aconselhável que adotemos um isolamento ainda mais rígido o mais rápido possível. É bastante provável, como já apontaram alguns especialistas, que o pico ocorra neste mês de Abril e em Maio, o que significa dizer que boa parte das pessoas serão infectadas nesta e na próxima semana, tornando ainda mais imprescindível este isolamento total. Com ele, é possível que não só achatemos a curva, mas que a possamos esmagá-la, erradicando o vírus no Brasil, em dois ou três meses.
O próximo artigo será sobre a economia em tempos de coronavírus. Vou analisar o que outros países têm feito e como nós vamos precisar lidar com o impacto que a pandemia tem e vai continuar tendo em boa parte dos brasileiros. Me refiro, primariamente, aos trabalhadores que ficarão sem renda, os trabalhadores informais e aqueles que tem que pôr suas vidas em risco durante este período, como os profissionais da saúde e os policiais. Por enquanto, temos que nos preparar física e psicologicamente porque tudo indica que o pior ainda está por vir.
Fontes:
https://www.livescience.com/coronavirus-flatten-the-curve.html
https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/03/levantamento-mostra-que-isolamento-comecou-a-achatar-a-curva-de-coronavirus-em-sp.shtml
https://www.bbc.com/news/world-europe-52182245
https://www.aljazeera.com/news/2020/04/trump-warns-lot-death-covid-19-battle-live-updates-200404232003006.html
RG 15 / O Impacto
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