Engenheira obidense é uma das maiores especialistas em materiais compósitos do mundo
A engenheira Ana Cristina Galúcio nasceu em Óbidos, no Pará, aonde só chega de barco, numa viagem de seis horas Aos 38 anos, a engenheira mecânica Ana Cristina Galúcio é uma das maiores especialistas em materiais compósitos do mundo e a principal pesquisadora na área do Airbus Group Innovations (AGI), braço de pesquisa e desenvolvimento do grupo Airbus. Agora, Ana terá a chance de trabalhar pela primeira vez no Brasil. Depois de 15 anos na França, ela foi escolhida como pesquisadora associada para o programa de parceria que a Airbus fechou com a Unicamp para criar uma cadeira industrial na faculdade de engenharia mecânica.
Com a nova cadeira a proposta é pesquisar o comportamento dinâmico de materiais compósitos (obtidos por meio de combinações entre metais, polímeros e cerâmicas) utilizados em aeronaves e helicópteros. Também serão oferecidos cursos para alunos de graduação e pós-graduação da Faculdade de Engenharia Mecânica da Unicamp (FEM). A cátedra será coordenada pelo professor Alberto Luiz Serpa, da FEM. O projeto será cofinanciado pelo consulado francês em São Paulo, a Unicamp e a Airbus. O trabalho da pesquisadora continuará sendo pago pela Airbus. A aplicação final, disse Ana Cristina, é na área de blindagem. “A Unicamp tem uma equipe muito competente na área de simulação computacional. A ideia é usar as ferramentas da FEM para tentar entender o comportamento dos materiais compósitos em estruturas aeroespaciais.” É a primeira vez que uma universidade brasileira vai estabelecer uma cátedra diretamente com a indústria. “Esta também é a primeira vez que a AGI empresta alguém do seu grupo para trabalhar no país”, disse o diretor-presidente do Airbus Group no Brasil, Bruno Gallard.
Na bagagem, Ana Cristina traz a experiência de ter trabalhado ativamente em programas estratégicos do grupo, como o desenvolvimento de seu mais novo e avançado jato comercial A350, para até 370 passageiros. A aeronave utiliza 54% de compósitos e 14% de titânio, o que garantiu uma redução de peso de 20 toneladas, além de diminuir em 40% os custos de manutenção. Com a iniciativa, a Airbus pretende estimular a pesquisa e desenvolvimento, além de qualificar estudantes e profissionais em uma das áreas mais avançadas da tecnologia aeroespacial. Ana Cristina é a única brasileira, e a única mulher, a integrar o grupo de 800 pesquisadores da AGI. “Já acolhi vários estudantes brasileiros na AGI na França porque a Airbus tem convênio com a USP de São Carlos. Mas esta será de fato uma oportunidade única para desenvolver um trabalho importante no Brasil”, disse a pesquisadora.
Ana nasceu em Óbidos, no Pará, de onde saiu muito jovem para estudar. A cidade paraense, de 50 mil habitantes, foi erguida na margem esquerda do Rio Amazonas, a 1,1 mil quilômetros de Belém por via fluvial. “Para chegar lá só de barco. São quase seis horas de viagem”, disse Ana. Os “fivelas”, como são chamados os que nascem em Óbidos (por causa do desenho que o Rio Amazonas forma em frente à cidade) misturam traços portugueses e indígenas. “Minha bisavó materna pertenceu à tribo dos Panxis”, lembra ela, com orgulho, das origens da família. Ana Cristina já se mudou para Campinas com o filho, de 19 meses. O marido veio para ajudá-la na adaptação, mas voltará para a França, para se dedicar ao trabalho na área de finanças e à nova carreira de especialista em pães. “Ela foi emprestada pela AGI por um ano. Depois volta para a Airbus na França, pois é considerada uma profissional importante para as pesquisas de ponta desenvolvidas pela empresa”, disse Gallard.
Pela AGI, a pesquisadora coordena vários projetos com universidades e centros de pesquisa franceses e de outros países. Quando postulou uma vaga na indústria, Ana Cristina também foi aprovada em primeiro lugar no concorridíssimo concurso nacional para professor universitário na França. As novas tecnologias que forem desenvolvidas no ambiente da cátedra na Unicamp também atenderão às demandas da Helibras, empresa controlada pela Airbus Helicopters, especialmente para o projeto de desenvolvimento do helicóptero 100% nacional.
A Airbus Group Innovations, segundo Gallard, tem a missão de apoiar o desenvolvimento das divisões do grupo no mundo. No Brasil, além da Helibras, a Airbus controla a empresa Equatorial Sistemas, adquirida em 1996. A empresa desenvolve sistemas tecnológicos para a área espacial, de defesa e segurança, e fornece equipamentos e componentes eletrônicos para diferentes tipos de missão. A entrevista de Ana ao Valor termina com a chegada do presidente e fundador da Equatorial, César Ghizoni, que veio buscá-la para uma reunião na qual será discutida a proposta de um novo projeto para o programa espacial brasileiro. “A ideia é desenvolver uma capacidade no Brasil para qualificar componentes de uso espacial complexos, como microprocessadores e memórias, que são bastante afetados pelas partículas de alta energia da atmosfera”, disse Ghizoni. A área, segundo ele, ainda é um gargalo tecnológico para o Brasil. “Queremos desenvolver essa capacidade no país em parceria com as universidades e institutos de pesquisa como o IEAv (Instituto de Estudos Avançados), do DCTA (Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial)”, disse o executivo.
Fonte: RG 15/O Impacto, Valor Online e Folha de Óbidos