Nicolás Maduro é o novo presidente da Venezuela
Com 99,12% das urnas apuradas, e após uma espera de mais de cinco horas, o Conselho Nacional Eleitoral divulgou na madrugada desta segunda-feira a vitória de Nicolás Maduro como novo presidente da Venezuela. Apontado como herdeiro por Hugo Chávez antes da sua morte, o candidato chavista teve 50,66% dos votos, contra 49,07% do opositor Henrique Capriles. A participação dos eleitores foi de 78,71%. Após o anúncio oficial, a oposição, que não reconheceu a derrota, denunciou mais de 3.200 irregularidades durante as eleições e tentativas de fraudar o resultado. Poucos minutos após o pronunciamento do conselho, Maduro assegurou que “Chávez continua invicto”, em discurso no quartel 4 F, onde está o túmulo do líder bolivariano. Em Caracas, fogos de artifício se misturavam com panelaços e buzinas, numa noite de extrema tensão em todo o país.
– Eles querem uma auditoria, nós vamos apoiar a auditoria. Eu formalmente peço à Comissão Nacional Eleitoral que faça uma auditoria. Mais cedo afirmei: ‘Se ganho com um voto, ganhei. Se perco com um voto, aceitarei o resultado’ – disse Maduro logo após a divulgação dos resultados, em um palaque em frente ao Palácio Miraflores.
A diferença de pouco mais de um ponto percentual, considerada “irreversível” pelas autoridades eleitorais, abriu uma delicada crise política no país, já que a decisão de Capriles, segundo confirmaram seus colaboradores, foi “resistir”. O primeiro passo foi dado pelo reitor do CNE Vicente Díaz, o único opositor do organismo, que pediu uma recontagem dos votos. A demora do órgão em divulgar os resultados alimentou uma usina de rumores, um deles sobre frenéticas reuniões entre membros das Forças Armadas, para analisar o delicado cenário pós eleitoral. Segundo comentaram jornalistas locais, dirigentes da oposição tentaram um contato com membros do governo, para evitar que a disputa política termine em choques entre chavistas e antichavistas nas ruas do país.
Em frente ao Palácio Miraflores, Maduro defendeu a realização de uma recontagem, mas enfatizou que “a decisão do povo deve ser respeitada, a democracia é o poder das maiorias. Ganhei por quase 300 mil votos”. O resultado foi muito mais apertado do que o esperado pel chavista, que falava em conseguir 10 milhões de votos para homenagear o presidente morto em 5 de março. Em outubro de 2012, quando foi derrotado, Capriles conquistou 6,59 milhões de votos, 1,6 milhão a menos do que o presidente. Maduro, no entanto, não se mostrou abalado com a eleição acirrada.
– Hoje podemos dizer que temos uma vitória eleitoral justa, legal, popular – afirmou o candidato, aplaudido por uma multidão de chavistas.
Os centros de votação começaram a fechar às 18h (19h30 de Brasília) após 12 horas de votação. Segundo as Forças Armadas, 43 pessoas foram detidas.
– Depois de uma intensa jornada eleitoral, queremos felicitar o povo venezuelano por uma jornada de votação tranquila e pacífica que decidiu o destino do país – afirmou Tibisay Lucena, presidente do CNE, ao anunciar a vitória de Maduro.
As primeiras eleições presidenciais nos últimos 14 anos na Venezuela sem o nome de Hugo Chávez na cédula foram marcadas por denúncias de irregularidades por parte do governo de Maduro. A jornada eleitoral começou às 3h, com o tradicional “toque de diana”, método usado pelos chavistas para convocar seus cabos eleitorais usando trompetes e outros instrumentos que animaram a madrugada de um longo dia. Como ocorreu nas eleições presidenciais de outubro e em outras, o PSUV usou toda sua máquina para mobilizar eleitores, aplicando a chamada “operação-reboque”. Longe de negar o polêmico método, que busca reduzir a abstenção entre seus seguidores (o voto é facultativo na Venezuela), dirigentes do partido oficialista explicam abertamente o modus operandi.
Antes de votar, Maduro convocou uma coletiva de imprensa transmitida ao vivo pelos principais canais públicos, onde aproveitou para reiterar suas promessas de campanha. A transmissão, no dia da votação, provocou indignação nas redes sociais. Os chavistas também fizeram uma força-tarefa para levar os partidários às urnas. Na chamada operação reboque, foram disponibilizados transportes para eleitores que apoiam o candidato governista e até ligações telefônicas foram feitas para que nenhum chavista deixe de votar.
No início da noite, o candidato opositor exigiu ao CNE “o fechamento total das mesas de votação” e denunciou tentativas de “mudar a vontade expressada pelo povo”. A oposição reforçou, ainda, as denúncias sobre “a utilização dos meios de comunicação estatais até mesmo no dia da eleição presidencial”. A resposta dos chavistas foi imediata:
– Vamos defender o resultado. O povo deve ter essa certeza – disse, confiante e sorridente, o chefe do comando chavista, Jorge Rodríguez.
Fiel soldado da ‘revolução bolivariana’
O candidato do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) e presidente interino desde a morte de seu mentor, em 5 de março, iniciou sua carreira política longe dos quartéis, ao contrário de muitos dos homens que estiveram perto de Chávez em seus 14 anos de governo. Maduro foi motorista de ônibus e piloto de trem do metrô de Caracas, além de líder sindical. Conheceu o então tenente-coronel Hugo Chávez durante sua prisão, após o levante militar de 1992. Como muitos outros dirigentes de esquerda, buscou aproximar-se do oficial, que começava a surgir como liderança opositora. Foi nessa época que conheceu sua mulher, Cilia Flores, atual advogada-geral da nação e, em 1992, uma das defensoras de Chávez.
Maduro sempre foi um soldado leal à revolução de Chávez. Hoje, diz ser seu “filho”, e atribui a ele tudo o que aprendeu sobre política. O atual presidente venezuelano nasceu em Caracas, numa família humilde que vivia na favela de El Valle. Não tem estudos universitários, e sua falta de formação acadêmica é um dos pontos mais questionados de seu currículo pela oposição. Nos últimos dias de campanha, o candidato do PSUV cometeu alguns erros de geografia, o que redobrou os ataques opositores.
Durante todo o tratamento realizado por Chávez para combater um câncer diagnosticado em junho de 2011, Nicolás Maduro acompanhou o presidente e sua família. O então ministro das Relações Exteriores da Venezuela, cargo para o qual foi designado em 2006, esteve com ele em Cuba e foi um dos poucos que tiveram acesso à intimidade do chefe de Estado. Aos 50 anos, Maduro tornou-se braço-direito do “comandante supremo” da revolução alardeada por Chávez e, em dezembro de 2012, foi escolhido seu sucessor.
Durante a campanha, Maduro recebeu o apoio de líderes como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente argentina, Cristina Kirchner. O candidato do Palácio de Miraflores tem um excelente relacionamento com muitos governos da região, principalmente de Brasil, Argentina, Bolívia, Peru e Cuba, o que lhe garante um importante respaldo. E, internamente, ganhou o polêmico apoio das Forças Armadas.
Fonte: O Globo