MILTON CORRÊA

O rio que muda de lugar e expulsa os trabalhadores das várzeas amazônicas

De repente, as margens do Amazonas formam barrancos que amedrontam os ribeirinhos como se o local tivesse sofrido um bombardeio. Mas não é nada disso, tudo é resultado do fenômeno natural chamado terras caídas.

Desastres naturais: Uma abordagem sobre as terras caídas

Texto acadêmico de minha autoria, Curso de Pós-Graduação em Jornalismo Cientifico – UFOPA, publicado no blog do professor / doutor e jornalista Manuel Dutra, em 28 de outubro de 2011.

O rio Amazonas, no verão, apresenta margens planas, constituídas de argila, que em alguns trechos produzem lamaçais, com uma vegetação rasteira, árvores exóticas, pássaros aquáticos mariscando, um espetáculo natural de rara beleza, o bucolismo enche os olhos de quem admira a criação de Deus.

Mas, de repente, às margens do mesmo rio, nos deparamos com o trágico. Barrancos se formam em alturas que amedrontam como se tivesse o local sofrido um bombardeio. Mas não é nada disso, tudo é resultado do fenômeno natural chamado terras caídas.

Fiz essa constatação nos dias 24 e 25 de setembro de 2011, quando fui e voltei, no barco Comandante Kaique, entre a localidade Ribeirinha de Aritapera (minha terra natal) e Santarém, passando pela comunidade de Fátima de Urucurituba, às margens do rio Amazonas, (local do município de Santarém onde se concentra o fenômeno das Terras Caídas), que tem feito desaparecer casas, escolas, gado, árvores frondosas e deixa as famílias que ali insistem em residir em clima de pânico, principalmente no período da vazante do rio, quando o fenômeno é mais frequente.

Ribeirinhos das comunidades atingidas, dizem não ter precisão desde quando o fenômeno ocorre, mas lembram que os seus antepassados já comentavam sobre as terras caídas.

É o caso de Rosinaldo Moraes, pecuarista e morador da localidade de Aritapera. “Desde criança que ouço falar nas terras caídas, que derrubam enormes áreas de terras e fazem desaparecer árvores”, comenta. Acrescenta que em seu entendimento há várias formas de manifestação do fenômeno, quando destrói o terreno em grande extensão e quando invade uma área, formando uma “enseada”, uma entrada do rio, como se fosse um braço. “É tudo tão de repente, a destruição é inevitável, um barulho que amedronta, faz a gente pensar que tudo está se acabando”!

Em Santarém

Em Santarém, o fenômeno das terras caídas se dá principalmente em Fátima do Urucurituba, comunidade ribeirinha do rio Amazonas, localizada no interior do município. Dezenas de famílias que residem na comunidade, distante uma hora e meia de barco da cidade, continuam sendo vítimas do fenômeno.

Essa informação era à época da Secretaria Municipal de Segurança Cidadã: Das 71 famílias que moravam em Fátima do Urucurituba, hoje somente 20 insistem em continuar na localidade, alegando que não têm para onde ir. As outras 51 abandonaram a comunidade e moram hoje em outros locais, como em áreas de ocupação, na zona urbana.

De acordo com a Agência Amazônia de Noticias, no mais recente episódio do fenômeno das Terras Caídas, em março de 2011, em Fátima de Urucurituba, “a correnteza do rio varreu um trecho de cerca de 500 metros de extensão, de um total de 1,3 mil metros, destruiu dez casas e uma escola municipal. A destruição e o risco de mortes obrigaram a Defesa Civil de Santarém considerar a região como área de risco.

Luiz Alberto da Cruz (atualmente vereador), então secretário Municipal de Segurança Cidadã e coordenador da Defesa Civil, dizia que esse é um fenômeno comum na região de várzea, mas sempre ocorre de forma moderada. “Dessa vez aconteceu com mais força e a água engoliu uma grande faixa de terra”, relatava “Acreditamos que em pouco tempo, se essa tendência continuar, a água do Rio Amazonas vai cobrir toda comunidade”, observava

Assoreando igarapés

“O fenômeno das terras caídas está assoreando alguns igarapés que deságuam no grande rio Amazonas. “É o caso do Igarapé da Praia, na região do Tapará, interior do municipio”. A afirmação é do então vereador Evandro Cunha, feita em pronunciamento na Câmara de Santarém, no dia 3 de outubro de 2011. Segundo ele, com o fenômeno das terras caídas o terreno é removido de um lugar e acumulado em outro, “e assim está assoreando na boca de cima do Igarapé da Praia, causando transtornos, barcos já não estão conseguindo passar”, constatava.

O vereador defendia que na boca de cima do Igarapé da Praia fosse feito um trabalho de escavação, para que as bajaras, com motor de rabeta, tenham acesso na época da vazante do rio Amazonas e possam ser utilizadas para escoar produtos agrícolas como a melancia, para ser comercializado no centro consumidor, que é a cidade de Santarém.

Outro problema ocorrido em Igarapé da Praia, com o assoreamento causado em conseqüência das terras caídas, é que a água deixa de circular “e se isso não a ocorre fica muito quente, impossibilitada para o uso doméstico e para a vida dos peixes”.

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